Ano 10, No. 74, Março 2016
Para que
funcionem de forma equitativa, independentemente de sua natureza jurídica, é
necessário que sejam bem administrados e regulados. E a regulação, ainda que
possa ser feita privadamente por um determinado setor no desempenho de suas
atividades, é um atributo do Estado, especialmente quando parte de seu
financiamento envolve recursos públicos.
Gonzalo Vecina é
um dos que defendem, assim como muitos (inclusive eu), que a discussão sobre
para onde vai o sistema de saúde está totalmente fora de foco no Brasil. Nesse
sentido este texto, que é uma adaptação da transcrição de uma palestra por
ele realizada na Mesa Redonda “Diferentes
Estratégias de Gestão de estabelecimentos de Saúde Vinculados ao SUS” -
debate promovido pela FGV SAUDE em parceria com a ABRASCO em março de 2015 –
mostra a vasta experiência do autor em ambos os setores da saúde (público e
privado) e deixa lições para aqueles que devem realizar reformas no setor.
Gonzalo é graduado
pela Faculdade de Medicina de Jundiaí e mestre em Administração, pela Escola de
Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (EAESP-FGV). Entre
os cargos que ocupou se destacam os de Secretário Municipal de Saúde de São
Paulo, Secretário Nacional da Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde, Diretor
Presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e Superintendente
do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo. Desde 1988 é Professor Assistente da
Faculdade de Saúde Pública da USP.
Neste artigo, Gonzalo trata de um tema que vem sendo relegado a um segundo plano na discussão de como fazer o SUS funcionar, mas que está na base das reformas que deverão ser feitas no futuro próximo. Com vocês, as
palavras do Professor Vecina.
Estratégias de Gestão de
estabelecimentos de
Saúde Vinculados ao SUS
Gonzalo Vecina
Neto
Um
pouco de historia
As entidades
privadas podem ter finalidade lucrativa ou não. As sem finalidades lucrativas
tem direito a imunidades tributarias. Como não tem finalidade de lucro, ou seja,
seu resultado deve sempre ser reinvestido na organização, elas são imunes ao
imposto de renda, entre outras vantagens. Porem além das imunidades, a
legislação por orientação da Constituição de 1988 e do ordenamento jurídico
posterior também propôs isenções tributarias e a Constituição somente perpetuou o que já
existia na legislação brasileira.
Imunidades
criam uma situação congênita, ou seja de nascimento, e sua contrapartida é o
reinvestimento do resultado na operação, que por sua vez está ordinariamente
voltada a sociedade, na medida em que as instituições sem finalidades
lucrativas atuam nos setores sociais – educação, cultura, saúde, lazer, etc. O
objetivo do legislador seria que instituições sem finalidades lucrativas
reinvistam todo seu resultado na atividade para a qual foram criadas e, dessa
forma, as imunidades são merecidas, já que o trabalho destas instituições se
volta para a sociedade.
Mas existem
organizações sem finalidades lucrativas que se aproveitam dessa situação e
constituem empresas que conseguem camuflar interesses particulares e somente
visam obter vantagens para seus dirigentes. Porem essa discussão situa-se na
esfera judicial, dado que o Estado deve fiscalizar estas entidades, uma vez que
seu objetivo precípuo é apoiar a melhoria das condições da vida na sociedade.
Por isso além da regra do reinvestimento dos resultados existem regras sobre a
governança, sobre a remuneração dos dirigentes, sobre como elas podem encerrar
suas atividades (não podem ser vendidas) que devem merecer a atenção e
vigilância do Estado.
Além das
imunidades, as entidades sem finalidades lucrativas podem também buscar
isenções tributarias. Isenções são renúncias que o Estado faz ao recolhimento
de impostos e que para serem concedidas pelo Estado exigem das entidades uma
contrapartida em serviços. Portanto a imunidade é congênita. Não cabe a decisão
se é ou não sem finalidade lucrativa. Nasce imune e a decisão de isentar os
recolhimentos é tomada pelo Estado.
Atualmente, os
impostos que compõe a isenção são: a cota parte patronal do INSS, a contribuição
ao Sistema S (SESC, SESI, SENAC, etc), COFINS e PIS. Estas renuncias significam
um financiamento importante para as instituições que conseguem fazer jus a
elas. No setor saúde, grosso modo, pode se estimar que em torno de 10% do total
da receita liquida das instituições é constituida pela somatória das isenções.
Também deve ser
registrado que muitos advogados defendem que algumas dessas isenções, de acordo
com o espirito da lei maior e a intepretação deles, são na verdade imunidades
(que requerem como contrapartida apenas o reinvestimento de resultados e não a
prestação de serviços). Assim existem muitos processos, inclusive no Supremo Tribunal
Federal (STF), discutindo e aprovando esses temas, com consequências no mínimo
desastrosas para a sociedade, tanto em termos de recolhimento de impostos como
de prestação de serviços nas três grandes áreas do setor social – educação, saúde
e assistência social.
No período
anterior à Constituição de 1988, as instituições que cumpriam com os requisitos
exigidos para terem direito às isenções nestas três áreas entregavam serviços a
sociedade, como por exemplo vagas gratuitas aos pobres na educação ou em
creches, asilos na assistência social e assistência médica na saúde. Recebiam
de um colegiado ligado ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome
o Certificado de Beneficência e
passavam a ser chamadas de filantrópicas. Na área da saúde a filantropia passou
a ser quase sinônimo de Santa Casa. Mas existem muitos hospitais que são de
comunidades (outras religiões, comunidades de imigrantes) ou de sindicatos,
etc.
Antes da Constituição
de 1988 as organizações filantrópicas tinham um importante trabalho de
prestação de serviços assistencialistas na sociedade, com muito pouca ação do Estado
em sua estruturação, e obviamente faziam parte do tecido social de forma
coerente à sua própria estruturação. Em outras palavras se organizavam à sombra
da estrutura de poder e o serviam - um modelo que pode ser chamado de “casa
grande e senzala”.
Na saúde, antes
da Constituição de 1988, os hospitais filantrópicos deveriam oferecer serviços
no valor de pelo menos 20% de sua receita bruta (valorada através de sua
própria tabela de preços) aos pobres, então identificados no processo de
atenção na categoria de indigentes e sem nenhuma regulação do Estado. Quem
definia quem seria atendido era a própria instituição filantrópica.
Após a
Constituição de 1988, com a criação do SUS e a universalidade da atenção, todos
os brasileiros passaram a ter direito a assistência à saúde e os cidadãos
indigentes deixaram de existir. O ordenamento jurídico foi revisitado a partir
do § 7 do artigo 195 da Constituição e em 1993 foi publicada a Lei 8742/93 que
reorganiza a assistência social beneficente.
A regra geral da
saúde para estes hospitais filantrópicos passou a ser atender 60% de sua
capacidade operacional através da prestação de serviços ao SUS, sendo
remunerados por este através das tabelas do SUS - bastante defasadas - e cuja
diferença seria compensada pela renúncia fiscal e pelo atendimento aos
pacientes do sistema privado. Esta defasagem das tabelas do SUS em relação aos
custos do atendimento situa-se atualmente, em média, em torno de 40%, embora
esta estimativa esteja sujeita a muitas variáveis, como complexidade do ato
praticado, existência de escalas, sofisticação, etc.
Muito também se
discutiu em relação ao significado destes 60% de capacidade operacional dos
hospitais para o SUS. Medida em que? Em pacientes-dia? Em internações? Da
somatória de tudo que o hospital ou serviço faz? Com as diferentes
interpretações e a falta de fiscalização do Estado, floresceram as entidades “pilantrópicas”
que produziam(em) demonstrações falsas ou pelo menos maquiadas destes 60%.
Alguns hospitais
continuaram a seguir a regra anterior, atendendo pacientes com renda familiar
inferior a três salários mínimos (condição descrita na Lei para definir risco
social) e oferecendo seus serviços até o limite de 20% da receita bruta
valorada por sua própria tabela de preços. Isto em função da falta de definição
dos 60% e da notória defasagem das tabelas do SUS que inviabilizavam o funcionamento
destes hospitais, em particular os mais complexos. Esta situação criou um risco
jurídico para estes hospitais. Apesar da fragilidade do arcabouço jurídico, não
estava claro na legislação se esta regra ainda era válida para o setor saúde.
Nesse meio tempo,
entre 1993 e 2006, realizaram-se muitas discussões e a promulgação de decretos,
medidas provisórias, portarias, que foram dando um novo arranjo ao setor. A lei
12101/2009 e seu decreto regulamentador, 7237/2010, vieram criar um clima de
mais segurança jurídica ao setor. Paralelamente também o Ministério da Saúde
clareou bastante o conceito dos 60%, mas não melhorou a fiscalização, que
continua em grande medida sendo de responsabilidade dos municípios. De qualquer
forma a definição da entrega dos certificados de beneficência passou para o
âmbito do próprio Ministério da Saúde, que passou a avaliar se a instituição
cumpre ou não com os requisitos que a gabaritam a receber as isenções.
O que a Lei
trouxe de novo foi a possibilidade de que uma nova categoria de hospitais
aparecesse – os hospitais de excelência. A excelência é definida pela obtenção
de uma acreditação. Assim, hospitais sem finalidades lucrativas, com uma
acreditação aceita pelo Ministério da Saúde (MS), podem ser considerados de
excelência, se assim o requisitarem e prestarem contas dentro do arranjo
jurídico determinado.
Basicamente o
hospital de excelência deve devolver sua renúncia fiscal ao SUS através da
prestação de serviços nas áreas de educação, pesquisa, apoio ao desenvolvimento
do SUS e assistência medica (esta limitada a 30% do total da renúncia). Esses
serviços serão valorados pelo seu custo e esta apuração deverá ser fiscalizada
pelos Ministério da Saúde e da Fazenda,
este último através da Receita Federal.
Os hospitais de
excelência que hoje[i]
são seis no pais (Hospital Sírio Libanês, Hospital Israelita Albert Einstein,
Hospital Samaritano, Hospital do Coração, Hospital Alemão Oswaldo Cruz e
Hospital Moinhos de Ventos) deram origem ao PROADI – Programa de Apoio ao
Desenvolvimento Social do SUS. Este programa tem a tarefa de analisar os
projetos propostos por estes hospitais, aprova-los, submete-los à Comissão
Tripartite, acompanha-los e fiscaliza-los após o recebimento da prestação de
contas que é trienal.
Obviamente este
é um projeto bastante recente e deverá receber nos próximos anos um
acompanhamento cuidadoso. Através do website do MS é possível verificar os
projetos executados e em execução. E o balanço é bastante positivo, apesar de
que este olhar poderá ter diferentes vieses. É o que se buscará discutir a
frente.
Gestão
de serviços de saúde (hospitais) nos dias atuais no Brasil
Gestão é atingir
os objetivos de uma organização através da mobilização de recursos. Assim,
parece bastante simples mas não é. Recursos podem ser entendidos como
conhecimentos, tecnologias, processos, equipamentos, materiais, pessoas.
Objetivos, que muitos pensadores da área de gestão indicam ser a área mais
delicada de uma organização, requerem definir o que a organização deve
fazer para poder ter sua existência justificada na sociedade. Este, provavelmente, é
um ponto mais complexo de construir que a mobilização de recursos.
De qualquer
forma, as últimas quatro décadas viram a área da gestão passar por um revolução
bastante complexa. A idéia de estratégia, principalmente após a segunda grande
guerra mundial, e a idéia de aferição da qualidade, entendida como a referência
que deve ser sempre alcançada, criaram um primeiro movimento experimentado
principalmente na reconstrução dos países destruídos pela guerra. As ideias de
Ansoff[ii]
e Juran[iii]
são exemplos desses movimentos.
Esse movimento
foi ainda turbinado no início dos anos setenta pela revolução comunicacional –
a aldeia global de McLuhan[iv]
e o advento do acesso mais universal ao processamento eletrônico de dados, que
por sua vez ganhou nos anos seguintes dois fantásticos dinamizadores – o Personal Computer (PC) e a rede web.
Este conjunto de elementos transformou trabalhadores e consumidores. Aumentou
muito a necessidade de ter mais bens e serviços, fazer coisas novas e
transformar a realidade destes e a do mundo. O mundo das revoluções não
conseguiu ir aonde o mundo das disrupções acabou chegando no final do século
passado. O que as revoluções sonharam, essas descobertas chegaram muito perto
de conseguir oferecer. É verdade que não se criou um mundo mais igual, mas se
desenvolveu nas pessoas o sentido de que existe a possibilidade de ser mais cidadão.
Estas transformações trouxeram novas ferramentas para o campo da gestão, novos
conceitos inimagináveis até então. Zero estoque, zero defeito, customização, balance score card (a empresa em uma
folha de papel), produção empurrada x produção puxada, gestão da clínica,
segurança do paciente, enfim um sem número de novas formas de aumentar a
eficiência sem comprometer a eficácia. E tendo como resultado mais lucro, mais
acesso e mais impacto social.
O mundo
melhorou? Sim, mas passaram a correr novos
riscos, como o ambiental, o crescimento das desigualdades e a necessidade de
revisitar o papel do Estado. O Estado como provedor de bem estar social é o
Estado a ser revisitado. O Estado tradicional dos tempos passados não somente
construía bem estar social como ele próprio era seu produtor. Porém, o Estado, com a revolução tecnológica
na gestão, com sua multiplicidade de funções e com a necessidade de usar
isonomicamente seus recursos, deixou de ser capaz de alcançar os padrões de
eficiência que o setor privado alcança. E
dessa forma, como aconteceu em muitos países, o Estado saiu do fazer e passou a
se preocupar com a entrega através do desenvolvimento de uma nova função – a regulação.
No Brasil, o fim
da ditatura, o processo de redemocratização, a necessidade de diminuir
desigualdades, a necessidade controlar a inflação, o processo de globalização e
a revolução da gestão aconteceram concomitantemente e a dialética desses
complexos processos levou a muitos erros de avaliação e confusões sobre a necessidade
de um novo papel do Estado construtor de bem estar social.
Na área da saúde
essas complexidades foram maximizadas pela própria questão dos significados da
saúde para a sociedade. Assim a questão
do com e sem finalidade de lucro confundiu-se com o público-estatal x privado-particular.
E o privado virou um patinho feio, mesmo quando estatal. Essa foi a
manifestação do Conselho Nacional de Saúde (CNS) quando da analise da proposta
das Fundações Estatais de Direito Privado. A proposta não foi aceita quando o
que propunha era um instrumento de melhoria da gestão do Estado. O conselho
concluiu que elas eram privatizantes e mercantilistas.
Na confusão público x privado paira ainda a discussão
do lucro x não lucro em saúde, numa
sociedade capitalista como brasileira, onde sessenta por cento da rede
hospitalar é privada e a atenção primaria através da estratégia da saúde da
família é predominantemente realizada pela iniciativa privada. A questão não deve ser lucro
ou não lucro e sim regulação das atividades no campo da saúde que tem como
objetivo o lucro. Mas com muita transparência das organizações que realizam as
atividades regulatórias para protege-las da captura por parte dos agentes
econômicos.
Então quais são
os desafios a serem enfrentados pela gestão? Resumidamente
e com objetivo de estimular o debate, aponta-se alguns desafios:
A Regulação, aqui entendida como um conjunto de atividades desenvolvidas pelo Estado
para construir bem estar social é um desafio da sociedade. Definir bem estar
social e como financia-lo é uma discussão aberta na saúde, que é sub-financiada
no pais. Em seguida vem a discussão do que regular. O Estado deve determinar
que serviços podem funcionar inclusive no setor privado? O Estado deve regular
a oferta de serviços de saúde? Na medida em que existe risco nos serviços
oferecidos, sim deve. Por exemplo, uma equipe de cirurgia cardíaca que opera
menos de 200 casos por ano tem resultados piores (risco/dano) do que outra com
um movimento maior.
A oferta de
serviços de alta complexidade como tomografias, ressonâncias magnéticas
nucleares deve, como acontece em outros países, passar pela regulação do Estado,
independentemente se vão atuar exclusivamente no SUS ou não. E a justificativa
é que o Estado deve oferecer universalmente a gestão de risco à sociedade.
Portanto trata-se de definir de maneira ampla a função regulação e construir um
Estado capaz de oferece-la a sociedade, ou seja, regular acesso, oferta e as coberturas
dentro do SUS e dentro da medicina privada e da saúde suplementar.
Reforma
Administrativa. Este é um dos macro desafios do Estado
brasileiro. Faz ombro com outras reformas estruturais fundamentais como a
reforma tributária, a reforma fiscal e a reforma política. Mas é o patinho
feio. A reforma administrativa é vista
entre as reformas como a última a ser pensada por envolver o que fazer do Estado
e pela desmotivação de enfrentar a discussão sobre a eficiência do Estado na
sociedade.
Desde a criação
do Departamento da Administração do Pessoal (DASP) na ditadura Vargas, passando
pelo decreto-lei 200/67 da ditadura militar e pela reforma administrativa
Bresser no governo Fernando Henrique Cardoso, se busca uma saída para a questão
da eficiência. Estas reformas conseguiram alguns avanços, mas estes em parte
foram compensados por outros retrocessos. Assim a Constituição de 1988
esterilizou as alternativas do decreto-lei 200. Autarquizou as Fundações Estatais
e acabou com a possibilidade da existência das fundações de direito privado.
Estas últimas foram parcialmente recuperadas a partir da reforma Bresser, mas
com uma solução ruim na área de pessoal (emprego público). Da mesma forma as
autarquias perderam muito de sua capacidade de atuação e mesmo as empresas
públicas foram muito tolhidas. Ocorreu nos anos de redemocratização um
movimento pendular de negar a autonomia e o processo de descentralização da
gestão. Paralelamente os Tribunais de Contas passaram a agir na gestão e não na
fiscalização. Obras e serviços hoje são analisados ex-ante e não ex-post, como
deveria ser a função destas cortes. Assim o que se tem é uma
desresponsabilizacão do Executivo em relação às suas obrigações.
O Estado
brasileiro é muito atrasado e precisa de uma reforma de sua estrutura legal. Ele
está próximo à paralisia e aí tem tentado lançar mão de alternativas em
particular oriundas da reforma Bresser que no entanto ainda são relativamente
insipientes como as PPPs, OSs e OSCIPs.
Cooperação
Público Privada. Neste caso se enquadram as
parcerias com a iniciativa privada. Não confundir com PPP – Parceria Público
Privada, que é um modelo interessante e que na saúde ocorre, neste momento,
apenas com a experiência do Hospital do Subúrbio em Salvador, com excelentes
resultados. Este tópico se enquadra na área da reforma administrativa. E de
novo, seu grande desafio é a capacidade do Estado em definir o que quer e construir
uma relação transparente com o contratado, que é sempre uma organização privada
com finalidade lucrativa.
O que se refere
como parceria com a iniciativa privada aqui restringe-se às parcerias com
entidades sem finalidades lucrativas e está no campo da cooperação público-privada.
Basicamente são as relações desenvolvidas entre Organizações Sociais e o Estado.
Hoje muitos Estados e municípios tem experiências para serem analisadas e,
inclusive, já existem os maus exemplos que também devem ser analisados. Eles
normalmente revelam uma incapacidade do Estado em escolher estas instituições e, em particular, em fiscalizar e dar transparência na relação com estas
instituições. Certamente as melhores experiências do Brasil com este modelo
ocorrem em São Paulo (Estado e Município). Outra casca de banana neste caminho
é a ameaça constant, pelo Ministério Público, em exigir o uso da Lei de compras
e licitações públicas - a 8666 - para regular estas relações, inclusive
limitando os contratos em cinco anos.
É neste tópico
que se inserem os hospitais de excelência e o PROADI. Também alguns dos
hospitais de excelência trataram de criar suas Organizações Sociais para
desenvolver suas parcerias com a administração pública. O HSL administra três
hospitais públicos, o HIAE administra dois hospitais públicos e o HMV
criou e administra um hospital dedicado
a atender o SUS.
Terceirização. O modelo acima exposto, pode
ser considerado uma terceirização mas, dado não ter lucro envolvido, é um modelo
de cooperação. No entanto as questões tecnológicas e de escala econômica
trouxeram para o campo da saúde a necessidade de se pensar na terceirização de
áreas menos nobres, como a área de limpeza, segurança patrimonial, manutenção,
lavanderia, e também áreas mais nobres como os serviços de patologia clínica,
diagnostico por imagens, anatomia patológica e até a contratação de equipes
medicas como ocorre na anestesia, UTI e pronto socorro.
Este movimento é,
em grande medida, fruto da incapacidade de trabalhar com as limitações da
administração pública. Porque terceirizar a limpeza? Principalmente pela
impossibilidade de responder ao turn over dessa área com o instrumento do
concurso público. Da mesma maneira nas áreas mais sofisticadas, a incapacidade
de acompanhar as práticas de remuneração do mercado como ocorre na área de
imagem ou de anestesia. Ou a incapacidade de montar sistemas de realização de
exames laboratoriais com escalas econômicas, que o setor público tem, mas que
exigem uma dinâmica na manutenção da capacidade de gerenciar a tecnologia e
repor equipamentos e materiais que a Lei 8666 não permite.
Aferição de Resultados. Medir. Esse é o desafio. Nada é adequadamente medido.
Principalmente na área pública. Em particular, em decorrencia do baixo nível de
informatização. Medir é uma tarefa mal realizada. Com certeza, buscar explicar
essa incapacidade utilizando como causa um meio – a informatização, também é em
parte um equívoco. Na verdade se realça o baixo nível de informatização como
forma de destacar o atraso do setor público na utilização da tecnologia de
informação que trouxe um empoderamento organizacional fundamental. Mas a
incapacidade de medir tem a ver muito mais com a incapacidade de definir
objetivos e construir indicadores adequados.
Essa
incapacidade de medir é também reflexo da falta de transparência das ações do Estado
na sociedade e é um processo histórico no Brasil. Talvez essa seja a transformação
mais exigida hoje: a do Estado. Como ele estabelecerá vínculos com a sociedade
a quem ele deve servir? A sensação que se tem é que existe uma inversão nos elementos
que se analisam e aí os meios ocupam um espaço desproporcional em relação aos
fins. Assim é mais importante fazer do que entregar. Ser lucrativo ou não é
anterior a discussão das entregas, e em particular a discussão da capacidade de
ser mais eficiente e, em o sendo, de gerar mais resultados para a população.
Com certeza
existe pouco acumulo nesta discussão e, em parte, os atores da saúde no Brasil
tem envergonhadamente evitado discutir com profundidade a questão da gestão. A
entrada dos seis hospitais de excelência nessa equação traz um oportunidade a
mais para aumentar esse acúmulo que talvez gere a massa crítica que transforme
a realidade.
Finalmente, um
antigo ditado espanhol que se refere a uma derrota para os árabes talvez possa
servir de lição para os dias atuais: vieram os sarracenos e nos derrotaram,
porque Deus ajuda os maus quando estes são em maior número que os bons. Temos
que buscar mais bons, e eles virão do bom debate.
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