Ano 8, No. 50, Janeiro 2014
André Medici
André Medici
1. Prevenção e Promoção da Saúde e Prevenção de Doenças;
2. Ampliação do Acesso aos Serviços de Saúde;
3. Humanização, Acolhimento e Qualidade;
4. Garantia da Assistencia Farmaceutica;
5. Saúde da Mulher e da Criança;
6. Fortalecimento da Saúde Mental, Prevenção e Tratamento do Uso de Drogas;
7. Melhoria da Infraestrutura da Rede de Atenção à Saúde;
8. Profissionais Necessários à Saúde dos Brasileiros;
9. Gestão Eficiente, de Qualidade e Voltada para o Usuário do Sistema;
10. Financiamento do Setor Compatível com o Crescimento, o Desenvolvimento Econômico e Social do País e as Necessidades do SUS;
11. Gestão Democrática e Participativa com Controle Social;
12. Capacidade de Regulação do Estado Brasileiro sobre Diversos Setores Econômicos;
13. Desenvolvimento e Fortalecimento do Complexo Produtivo da Saúde.
Cada um
destes treze pontos apresenta, no documento indicado, alguns destaques que
constituem os objetivos que deveriam ser perseguidos em cada uma das áreas. Mas
os treze pontos não apresentam objetivos quantitativos expressos em metas, tornando
difícil saber qual o ponto de partida (linha de base) e o alcance de cada um
dos objetivos. São objetivos sem metas e, portanto, seu alcance real é difícil
de ser medido. Por outro lado, são objetivos associados a processos e não a
resultados. A maioria dos verbos utilizados no documento são do tipo combater, garantir,articular, fortalecer, manter, etc. Muito pouco se
encontra associado a objetivos do tipo, alcançar,
atingir, eliminar ou reduzir. E menos ainda, de tanto, para quanto.
Em certo
sentido, os objetivos do programa buscaram se apoiar mais nos interesses de atores
relevantes do sistema do que nas necessidades de saúde da população. A
administração baseada em processos se limita a definir os recursos humanos,
materiais e financeiros, respondendo com a geração incondicional de empregos, compras
públicas, contratos e, com isso, atendendo aos interesses pactados entre os
sócios que apoiaram à construção do programa na corrida para as urnas.
Uma
administração baseada em resultados também poderá trazer o aumento de empregos
e compras públicas. No entanto isso ocorreria como um efeito colateral do que
seria necessário para o atingimento destes resultados e não sob a forma de compromissos
com os atores que se beneficiam dos processos. Os efeitos no emprego e nas
compras públicas estariam determinados pelo empenho do Governo na reversão das
condições de saúde e pelo seu compromisso social com a solução de problemas que surgem a partir de um
diagnóstico claro e transparente que
deveria orientar as açoes e políticas a serem implementadas. Os meios para atingir as metas de resultados
devem ser programados, não para responder ao jogo de interesses dos atores
responsáveis pelos processos, mas sim para calcular os recursos necessários e
sua sustentabilidade fiscal.
Por estes
motivos, se torna difícil avaliar a
métrica real dos objetivos de saúde do Governo entre 2011-2014. Eles não
aparecem sob a forma de metas mensuráveis. Por exemplo, de acordo com o ponto
2, tanto faz ampliar o acesso aos serviços de saúde em 0,01% como em 100% que o
objetivo estaria sendo cumprido. E dos treze objetivos elecandos, este é o
único onde o verbo reflete um certo compromisso com resultados.
O quadro
abaixo detalha os objetivos do documento.
Quadro 1
Objetivos Específicos Associados aos
Treze Pontos da Proposta Mais Saúde para
o Brasil Seguir Mudando com Dilma (2011-2014)
Pontos
|
Objetivos
Especificos
|
1.
Prenvenção e Promoção da Saúde e Prevenção de
Doenças
|
1.1 Combater as
desigualdades socioeconômicas, articular diferentes políticas públicas,
educar e mobilizar a sociedade para a vida saudável;
1.2 Implantar
políticas públicas para promoção à saúde (incentivo à prática de atividade
física e a alimentação saudável) e para redução da exposição a fatores de
riscos (controle do uso do álcool, fumo, uso abusivo de medicamentos) e a
articulação dessas ações com a atenção básica;
1.3 Ampliar o Programa
de Imunização;
1.4 Fortalecer a
Vigilância Sanitária e a vigilância ambiental;
1.5 Manter o combate
sistemático das endemias e criar a Força Nacional de Saúde para atendimento
às emergências envolvendo desastres naturais como enchentes e deslizamentos.
1.6 Ampliar a
cobertura da população que recebe água fluoretada.
|
2.
Ampliação do Acesso aos serviços de Saúde
|
2.1 Garantir plena
cobertura de atenção básica combinando Estratégia Saúde da Família e as
Unidades Básicas de Saúde, com o reconhecimento das especificidades
locorregionais;
2.2 Ampliar a oferta
de procedimentos de atenção especializada ambulatorial e hospitalar (exames, consultas,
internações, cirurgias e saúde bucal);
2.3 Expandir as
Unidades de Pronto Atendimento (UPA);
2.4 Universalizar o
SAMU e expandir as centrais de regulação, articuladas com a expansão da
oferta de leitos e de procedimentos especializados;
2.5 Implantar Centros
Regionais de Diagnósticos do SUS com a atuação de especialistas e exames
complementares;
2.6 Implantar Central
de Interpretação de Exames de Imagem;
2.7 Manter e Ampliar o
Programa Brasil Sorridente;
2.8 Implementar a
Política de Atenção à Saúde do Trabalhador;
|
3.
Humanização, Acolhimento e Qualidade
|
3.1 Assegurar a
qualidade dos serviços de saúde e humanizar as relações e vínculos entre as
pessoas, com a redução das filas e do tempo de espera e ampliação do acesso
às ações e aos serviços (estratégias de acolhimento, reorganização dos fluxos
internos das unidades);
3.2 Incentivar a
implantação da Internação Domiciliar e proporcionar a participação do usuário
no seu próprio cuidado;
|
4.
Garantia da Assistencia Farmacêutica
|
4.1 Ampliar o gasto
público com aquisição e distribuição gratuita de medicamentos e fortalecer o
Programa Farmácia Popular;
4.2 Atualizar
periodicamente as listas de medicamentos do SUS;
4.3 Fortalecer e
aumentar a oferta de medicamentos genéricos;
4.4 Expandir o
Programa Farmácia Popular do Brasil com a ampliação do elenco de medicamentos
e do número de farmácias privadas credenciadas no Aqui Tem Farmácia Popular;
4.5 Ampliar os
investimentos em Laboratórios Farmacêuticos Oficiais;
|
5.
Saúde da Mulher e da Criança
|
5.1 Promover a atenção
integral à saúde das mulheres conforme a Política Nacional de Atenção à Saúde
Integral à Mulher, a Política Nacional de Direitos Sexuais e Reprodutivos e a Política Nacional de
Planejamento Familiar;
5.2 Implantar a Rede
Cegonha para garantir que a gestante seja informada onde será o parto e o
acompanhante no pré-parto e parto;
5.3 Criar um sistema
de transporte de gestante de riscos e neonatal, articulado com o SAMU;
5.4 Reestruturar a
rede hospitalar de atenção obstétrica e neonatal, com ênfase nas
unidades que realizam atenção
especializada perinatal para gestantes e neonatos de alto risco, buscando atingir as
metas pactuadas de redução da morbi-mortalidade de gestantes e recém nascidos;
|
6.
Fortalecimento da Saúde Mental, Prevenção e
Tratamento do Uso de Drogas.
|
6.1 Aprofundar a
cobertura de atendimento para toda a população que sofre de transtornos
mentais e dar especial atenção à questão das drogas;
6.2 Garantir o
financiamento da rede extra-hospitalar com a ampliação dos serviços
substitutivos de saúde mental no País;
6.3 Implementar o
Programa Nacional sobre drogas e de atenção às pessoas que fazem uso delas;
6.4 Dar atenção
prioritária para a questão do crack, em uma ação articulada com diferentes
políticas públicas e parceria com ONGs voltadas o tratamento do usuário, o
apoio e prevenção para os jovens, as famílias, as comunidades;
6.5 Apoiar a ampliação
do número de CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) principalmente CAPS álcool
e outras drogas e CAPS infanto-juvenil nos municípios com 70 mil habitantes,
e CAPS III (24h) nos municípios com 200 mil habitantes;
|
7.
Melhoria da Infraestrutura da Rede de Atenção à
Saúde
|
7.1 Implantar um
programa de reestruturação física das unidades de saúde em seus vários níveis
de atenção, que supere a defasagem do padrão físico atual em relação às
práticas modernas e humanizadas de atenção à saúde.
7.2 Reestruturar
fisicamente todas as unidades hospitalares de atenção especializada na área
de urgência e emergência que são referência para o SAMU;
7.3 Reformar e
construir unidades de saúde de acordo com as especificidades locais;
7.4 Construir 500 UPAs
para assegurar aumento da cobertura nos serviços de urgência pré-hospitalar;
7.5 Reformar e
construir hospitais nos locais de comprovada insuficiência de leitos;
|
8.
Profissionais Necessários para a Saúde dos
Brasileiros
|
8.1 Implementar
estratégias como o serviço civil e o financiamento específico para resolver
os vazios assistenciais, ainda identificados no País;
8.2 Levar o
profissional médico aos municípios com carência deste profissional por meio
de incentivos, associados à anistia de fi nanciamento estudantil e outros;
8.3 Ampliar número de
bolsas de residência no Norte, Nordeste e Centro-Oeste;
8.4 Adotar
parametrizações de cargos, carreiras e vencimentos mínimos nacionais e de
co-financiamento de pessoal pelas três esferas de governo;
8.5 Aprofundar as
políticas para combater a precarização do trabalho em saúde;
|
9.
Gestão Eficiente, de Qualidade e Voltada para o
Usuário do Sistema
|
9.1 Implantar um
sistema integrado de avaliação de todos os serviços do SUS;
9.2 Estabelecer metas
em todos os níveis de atendimento e de aferição de satisfação com os serviços;
9.3 Apoiar a
implantação de novos modelos gerenciais e administrativos, que atendam às
necessidades da nova realidade e que sejam compatíveis com os princípios do
SUS;
9.4 Garantir que a
política de pagamentos do SUS seja orientada pelos resultados e desempenho;
9.5 Implementar as
possibilidades de articulações regionais (consórcios intermunicipais, redes,
unidades de referência regional e outras);
9.6 Definir, através
de legislação específica, as responsabilidades das três esferas de governo e
os direitos e deveres de todos os participantes do setor saúde;
|
10. Financiamento para
o Setor Compatível com o Crescimento,
o Desenvolvimento Econômico e Social do País e com as Necessidades do
SUS.
|
10.1 Regulamentar a EC
29, que fixa novos patamares de vinculação da receita e define o que são
ações e serviços públicos de saúde;
10.2 Promover maior
equidade na distribuição dos recursos federais e estaduais para a saúde
utilizando critérios epidemiológicos, de rede instalada, renda per capita,
IDH e outros paracorrigir as desigualdades;
10.3 Aperfeiçoar os
mecanismos de acompanhamento, monitoramento e controle social dos recursos do
Ministério da Saúde e os transferidos a Estados e Municípios, priorizando o
combate ao desperdício e desvios;
|
11. Gestão Democrática
e Participativa com Controle Social.
|
11.1 Fortalecer as
estruturas de gestão participativa (colegiados de gestão, diálogos com os
movimentos sociais e sindicais, plenárias, conselhos e conferências de saúde;
11.2 Fortalecer o
Conselho Nacional de Saúde;
11.3 Ampliar os
sistemas de monitoramento, ouvidoria e auditoria como instrumentos de controle
do sistema e diálogo com a população;
|
12. Capacidade de
Regulação do Estado Brasileiro sobre os Diversos Setores Econômicos
Pertinentes à Saúde;
|
12.1 Reforçar o papel
do Ministério da Saúde na articulação das Agências Reguladoras (ANS e ANVISA)
para garantir os princípios constitucionais da Universalidade, Equidade e
Integralidade do Sistema;
12.2 Implementar a
regulação do processo de incorporação e retirada de tecnologias no SUS e na
Saúde Suplementar;
12.3 Efetivar o
ressarcimento dos procedimentos realizados nos usuários de planos e seguros
de saúde no âmbito do SUS. Conformar e consolidar o Sistema de Saúde
Brasileiro, garantindo a ampliação e funcionamento adequado;
|
13. Desenvolvimento e Fortalecimento
do Complexo Produtivo da Saúde
|
13.1 Ampliar linhas de
pesquisa relacionadas à produção nacional de medicamentos de interesse do
SUS. Incentivar o complexo industrial da saúde com linhas de financiamento,
política de compras governamentais, subvenções econômicas e incentivos
fiscais;
13.2 Fortalecer as
empresas nacionais, participantes do Complexo Industrial da Saúde por meio da
modernização de plantas tecnológicas da incorporação de centros de pesquisa,
construção de arranjos produtivos, agregação de valor e incremento do poder
econômico;
|
No que se refere ao conteúdo, os objetivos traçados no programa 2011-2014 parecem não estar alinhados a algumas das principais necessidades da população brasileira. Vejamos alguns exemplos:
·
Não
se faz menção à epidemia de doenças crônicas, como diabetes e
hipertensão, que hoje constitui o principal flagelo da população mais pobre do
país, como decorrencia dos processos de transição demográfica e epidemiológica.
·
Não
se menciona, como estratégia para o financiamento, a necessidade de uma
política efetiva de controle e combate à corrupção e ao mau uso dos recursos,
nem a geração de uma consciência e compromisso com a ética na gestão do SUS.
·
Não
se menciona os processos reais que poderiam levar ao aumento da qualidade e do
controle dos serviços de saúde, como a criação de instâncias sólidas para a
acreditação de unidades e redes de saúde e indicadores de segurança dos
pacientes, para evitar a morbidade e a mortalidade dentro das unidades de saúde
por falta de recursos, profissionais e descaso com os cidadãos.
·
Faltou
a promessa de melhorar os sistemas de informação, como a histórica clínica eletrônica ou a retomada do cartão SUS, para aumentar a
eficiência no uso das informações e dar respostas individualizadas aos usuários na busca de
resultados tangíveis de melhoria da cobertura e qualidade do sistema.
Por tudo o
que faltou no programa de saúde do partido que venceu as eleições presidenciais
de 2010, muitos pensam que um plano para melhorar a saúde do país, ajustado as
necessidades da população brasileira, deveria ser mais comprometido com o longo
prazo e com um diagnóstico responsável sobre o que falta na saúde do país. Mas
não se pode mudar o passado e o programa e seus objetivos estão aí. Portanto, a
sociedade brasileira deveria avaliar se estes objetivos foram alcançados, com a
intenção de propiciar uma medida técnica e objetiva do que se conseguiu
implantar em relação ao que foi prometido. Mas deveria também discutir se as
promessas feitas foram aquelas que mais se ajustaram às necessidades de saúde
da população brasileira, que vão muito além de uma visão de curto prazo.
O eventual
produto desta análise não seria nenhuma crítica ao SUS, aos seus princípios ou aos
seus implementadores. O SUS tem sido implementado por muitos técnicos e funcionários
comprometidos com a melhoria da saúde no país, desde o Ministério da Saúde às
Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, além de agências como a ANVISA, a ANS
e outros órgãos da administração direta e indireta. É um esforço que vai além
de uma visão político-partidária e integra pessoas de alta capacidade técnica,
probidade administrativa e boa vontade, as quais poderiam estar servindo ao
país em qualquer administração. Mas a condução da política e a implementação de
objetivos estratégicos é muito importante para o alcance de resultados
concretos, e portanto necessita ser avaliada para que se possa aprender com os
erros do passado e formular objetivos que estejam comprometidos com o longo
prazo e não somente o exercício das campanhas eleitorais.