domingo, abril 13, 2014

O Índice Bloomberg de Eficiência em Saúde: Aonde se Encontra o Brasil?




Ano 8, No. 55, Abril 2014


André Medici
Introdução                                                                                                                                                              
Bloomberg L.P. é um complexo de empresas de comunicação, sediado em Nova York, que tem por objetivo oferecer instrumentos para análises dos mercado de ações, títulos financeiros e valores, bases de dados sobre negócios e serviços correlatos, notícias e informações na mídia eletrônica, via web ou cabo e revistas semanais. Suas principais publicações são as revistas Bloomberg Businessweek e Bloomberg Markets. Foi fundado em 1981 por Michael Bloomberg e 30% de suas ações pertencem ao conglomerado financeiro Merrill Lynch. É uma instituição respeitada por oferecer informações confiáveis para investidores e para aqueles que vivem do dia a dia dos mercados financeiros e de negócios.

Com o processo de globalização, Bloomberg  tem cumprido o papel de informar aos interessados sobre o ambiente de negócios existente nos Estados Unidos e em distintos países, apoiando a tomada de decisões de investimento com informações comparativas sobre o clima de negócios, a economia e a sociedade. Tais informações são vistas pelos investidores como fatores que podem minimizar riscos e aumentar as sinergias para o retorno de seus investimentos.

Por este motivo, a Bloomberg divulga em um dos seus websites a série visual data: the best and the worst, que pesquisa vários temas que podem afetar o clima de negócios, sendo, portanto, de interesse para investidores e para aqueles que buscam oportunidades em países que oferecem melhores condições empresariais. Muitos temas tem sido analisados em distintos países, destacando-se perda de confiança dos investidores, uso de energia limpa, custos da justiça, preços dos imóveis residenciais, preços de comunicações, salários pagos a professores, pragas que contaminam a produção de alimentos, conectividade digital, desemprego juvenil, divida pública como proporção do PIB, risco de estagflação, gastos e principais destinos de turismo internacional, eficiência dos aeroportos, tendências da inflação, dependencia do petróleo, crescimento na venda de veículos, velocidade do processo de envelhecimento demográfico, disponibilidade de energia elétrica, tendências dos sistemas de aposentadoria e pensões, dimensão do emprego assalariado e por conta-própria, e muitos outros.

Na área de saúde, um dos temas que tem sido pesquisado (a última atualização ocorreu em agosto de 2013), foi o de eficiência da atenção à saúde. Os dados se baseiam em informações de 2011. A metodologia consistiu em ordernar os países de acordo com o nível de eficiência em saúde, medido por 3 indicadores: (a) expectativa de Vida ao Nascer (o mesmo utilizado pelo Índice de Desenvolvimeto Humano – IDH do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD); (b) o gasto anual em saúde como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) e; (c) o gasto percapita anual em saúde com a cobertura de atenção preventiva e curativa, planejamento familiar, atividades nutrição e cuidados de emergência. O primeiro indicador teria uma relação direta com a eficiência e os outros dois uma relação inversa. Estes tres indicadores foram combinados em um índice, que varia de 0 a 100, onde a esperança de vida tem peso de 60%, o gasto em saúde como proporção do PIB tem um peso de 30% e o gasto absoluto percapita em saúde tem um peso de 10%.

Foram considerados para o ordenamento dos países, somente aqueles com população de pelo menos 5 milhões de habitantes e renda percapita anual mínima de US$ 5,000.00. Isto permitiu que participassem 48 países, onde está incluido o Brasil. Os dados podem ser visualizados na página web http://www.bloomberg.com/visual-data/best-and-worst/most-efficient-health-care-countries. As informações utilizadas vieram das bases de dados do Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Organização Mundial de Saúde.

O índice de eficiência da saúde, neste sentido, seria medido pelo que se pode alcançar em esperança de vida ao nascer (medida em anos) com a atual porcentagem de gasto anual em saúde sobre o PIB, dada uma certa dimensão do gasto anual absoluto em saúde.

Os Resultados do Índice de Eficiência

Sem questionar estes resultados, podemos dizer que, entre os 48 países analisados, os cinco mais eficientes, de acordo com os critérios estabelecidos, foram Hong Kong, Singapura, Japão, Israel e Espanha (nesta ordem) enquanto que os cinco mais ineficientes foram nesta ordem Brasil, Sérvia, Estados Unidos, Iran e Turquia. A tabela 1 abaixo mostra os resultados alcançados pela Bloomberg.

Tabela 1

Indice de Eficiência de Atenção à Saúde da Bloomberg em Países Selecionados (Por volta de 2011)

Posição ou Ranking
(do mais ao menos eficiente)
País
Índice de Efciência
(Máximo 100 – Mínimo 0)
Posição ou Ranking
(do mais ao menos eficiente)
País
Índice de Efciência
(Máximo 100 – Mínimo 0)
1
Hong Kong
92,6
25
Holanda
48,5
2
Singapura
81,9
26
Venezuela
48,3
3
Japão
74,1
27
Portugal
47,2
4
Israel
68,7
28
Cuba
46,8
5
Espanha
68,3
29
Arábia Saudita
46,0
6
Italia
66,1
30
Alemanha
45,5
7
Austrália
66,0
30
Grécia
45,5
8
Coréia do Sul
65,1
32
Argentina
45,1
9
Suiça
63,1
33
Romenia
44,9
10
Suécia
62,6
34
Bélgica
44,5
11
Líbia
56,8
35
Perú
43,2
12
Emirados Árabes
56,6
36
Eslováquia
41,1
13
Chile
56,2
37
China
38,3
14
Reino Unido
55,7
38
Dinamarca
38,1
15
México
54,9
39
Hungria
38,1
16
Austria
54,4
40
Argélia
37,2
17
Canada
53,4
41
Bulgária
37,0
18
Malásia
52,8
42
Colombia
36,2
19
França
52,3
43
República Dom.
35,3
20
Equador
51,7
44
Turquia
33,4
21
Polônia
50,6
45
Irã
31,5
22
Tailândia
50,2
46
Estados Unidos
30,8
23
Finlândia
49,5
47
Servia
27,2
24
Rep, Tcheca
48,9
48
Brasil
17,4


Para exemplificar as comparações que podem ser feitas, Hong Kong, com um gasto em saúde percapita pouco maior que o do Brasil (US$1,409 x US$1,121) e um gasto em saúde como proporção do PIB quase 3 vezes menor (3.8% x 9.9%) apresenta uma expectativa de vida ao nascer de 10 anos a mais que a brasileira (83.4 anos x 73,4 anos).

Como tem apontado recentemente a literatura internacional, vale notar que um americano médio, com um gasto de saúde de 17,2% do PIB, que chega a US$8,608 em termos percapita, tem uma esperança de vida de 5 anos a menos que um residente de Hong Kong, o que demonstra um elevado nível de ineficiência no gasto em saúde.

Decompondo o Índice de Eficiência

O primeiro componente que deve ser analisado é o de resultado, que no caso seria a esperança de vida ao nascer.

Tabela 2

Esperança de Vida ao Nascer nos 48 Países onde se Avaliou o Índide de Eficiência de Atenção a Saúde 
(Dados de 2011)


Posição ou Ranking
(do mais ao menos eficiente)
País
Esperança de Vida ao Nascer
(em Anos)
Posição ou Ranking
(do mais ao menos eficiente)
País
Esperança de Vida ao Nascer
(em Anos)
1
Hong Kong
83,4
25
República Tcheca
77,9
2
Suiça
82,7
26
México
76,9
3
Japão
82,6
27
Polônia
76,7
4
Espanha
82,4
27
Emirados Árabes
76,7
5
Italia
82,1
29
Eslováquia
76,0
6
Singapura
81,9
30
Argentina
75,8
7
Israel
81,8
31
Equador
75,6
7
Austrália
81,8
32
Libia
75,0
7
Suécia
81,8
33
Hungria
74,9
10
França
81,7
34
Sérvia
74,6
11
Holanda
81,2
35
Romenia
74,5
12
Austria
81,0
36
Malásia
74,3
13
Coréia do Sul
80,9
36
Venezuela
74,3
13
Canadá
80,9
36
Bulgária
74,3
15
Reino Unido
80,8
39
Arábia Saudita
74,1
16
Portugal
80,7
40
Tailândia
74,1
16
Grecia
80,7
41
Perú
74,0
16
Alemanha
80,7
42
Turquía
73,9
19
Bélgica
80,5
43
Colombia
73,6
19
Finlândia
80,5
44
China
73,5
21
Dinamarca
79,8
45
Brasil
73,4
22
Cuba
79,1
45
Rep. Dominicana
73,4
23
Chile
79,0
47
Argelia
73,1
24
Estados Unidos
78,6
48
Irã
73,0


No que diz respeito a este indicador, o Brasil, entre os 48 países, empata com a República Dominicana na 45ª posição, mas tem a vantagem de estar melhor do que a Argélia e o Irã. Todos os outros países da América Latina que entraram na análise - Cuba, Chile, México, Argentina, Equador, Venezuela, Perú e Colombia – apresentam esperança de vida maior que a brasileira, mas paradoxalmente, todos eles tem um gasto per-capita em saúde bem menor que o do Brasil, segundo os dados da Bloomberg, como veremos nas tabelas 3 e 4.

Tabela 3

Gasto em Saúde como porcentagem do PIB nos 48 Países onde se Avaliou o Índide de Eficiência de Atenção a Saúde

(Dados de 2011)


Posição ou Ranking
(do mais ao menos eficiente)
País
Gasto em Saúde como % do PIB
Posição ou Ranking
(do mais ao menos eficiente)
País
Gasto em Saúde como % do PIB
1
Estados Unidos
17,2
25
Israel
7,8
2
Holanda
13,0
26
Argentina
7,7
2
Grecia
13,0
27
Bulgaria
7,5
4
França
12,5
28
Coréia do Sul
7,2
5
Servia
12,0
29
Polônia
7,1
6
Dinamarca
11,8
30
Chile
7,0
7
Alemanha
11,7
31
Turquia
6,5
8
Suiça
11,5
32
México
6,4
9
Portugal
11,4
33
Romenia
6,3
9
Belgica
11,4
34
Equador
6,1
11
Cuba
11,3
35
Colombia
5,6
12
Austria
11,2
36
Rep. Dominicana
5,2
13
Canadá
10,8
37
Irã
5,1
14
Espanha
10,4
38
China
4,6
15
Italia
10,4
39
Singapura
4,4
16
Brasil
9,9
40
Perú
4,4
17
Suécia
9,6
41
Venezuela
4,3
18
Finlândia
9,4
42
Argelia
4,2
18
Reino Unido
9,4
43
Emirados Árabes
4,1
20
Eslováquia
9,1
44
Líbia
3,8
21
Austrália
8,9
45
Hong Kong
3,8
22
Hungria
8,6
45
Tailândia
3,7
23
Japão
8,5
47
Arabia Saudita
3,6
24
República Tcheca
8,1
48
Malásia
3,3


A tabela 3 mostra que o Brasil, dos 48 países considerados no estudo do Bloomberg, é o 16º com gasto mais elevado em saúde como proporção do PIB, alcançando quase 10%. Com exceção de Cuba, é o país que apresenta a maior proporção de gasto percapita em saúde entre os latino-americanos. A participação do gasto em saúde no PIB brasileiro é maior que a de países que reconhecidamente tem os sistemas de saúde de melhor qualidade, como Suécia, Finlândia, Reino Unido e Austrália. Em que pese o fato de que o gasto em saúde no Brasil vem aumentando rapidamente nos últimos anos, existem alguns problemas já levantados em outras matérias deste blog, que são a baixa participação do gasto público no gasto total em saúde e a elevada participação do gasto direto das famílias. Mesmo assim, entre 2001 e 2011, a participação do gasto público em saúde no Brasil como proporção do PIB aumentou de 3,1% para 4,1%, de acordo com informações também levantadas pela Bloomberg L.P.

Tabela 4

Gastos Per-capita em Saúde nos 48 Países onde se Avaliou o Índide de Eficiência de Atenção a Saúde

(Dados de 2011)


Posição ou Ranking
(do mais ao menos eficiente)
País
Gasto Percapita em Saúde (em US$ correntes)
Posição ou Ranking
(do mais ao menos eficiente)
País
Gasto Percapita em Saúde (em US$ correntes)
1
Suiça
9.121
25
Hong Kong
1.409
2
Estados Unidos
8.608
26
Brasil
1.121
2
Dinamarca
6.648
27
Hungria
1.085
4
Holanda
5.995
28
Chile
1.075
5
Austrália
5.939
29
Polônia
899
6
Canadá
5.630
30
Argentina
892
7
Suécia
5.331
31
Arábia Saudita
758
8
Austria
5.280
32
Turquia
696
9
Bélgica
4.962
33
Sérvia
622
10
França
4.952
34
México
620
11
Alemanha
4.875
35
Cuba
606
12
Finlândia
4.325
36
Venezuela
555
13
Japão
3.958
37
Bulgária
522
14
Reino Unido
3.609
38
Romenia
500
15
Italia
3.436
39
Colômbia
422
16
Espanha
3.027
40
Libia
398
17
Grécia
2.864
41
Irã
346
18
Israel
2.426
42
Malásia
346
19
Portugal
2.311
43
Equador
332
20
Singapura
2.286
44
Rep. Dominicana
296
21
Emirados Arabes
1.640
45
Perú
289
22
Coréia do Sul
1.616
46
China
278
23
Eslováquia
1.534
47
Argélia
225
24
Rep. Tcheca
1.507
48
Tailândia
202


No que se refere ao gasto absoluto per-capita com saúde, o Brasil apresenta a 26ª posição entre os 48 países considerados, tendo o maior gasto per-cápita entre o conjunto dos países latino-americanos selecionados e também gastos superiores a vários países do leste europeu como Hungria, Polônia, Sérvia, Bulgária e Romenia.

Os resultados do Indice de Eficiência e seus componentes, permitem demonstrar, portanto, que o Brasil, não é um dos países que gasta menos em saúde, tanto do ponto de vista do gasto per-capita, como do gasto de saúde como proporção do PIB. Mas sua esperança de vida ao nascer é uma das mais baixas entre os 48 países selecionados pelo Índice da Bloomberg. Os dois gráficos abaixo permitem demonstrar que países como o Brasil e os Estados Unidos estão sempre dentro do que poderia ser chamado de zona de ineficiência dos resultados em saúde com relação ao gasto, ocorrendo o inverso com países como Hong Kong e Singapura.

A zona de eficiência seria aquela aonde a esperança de vida tende a ser proporcionalmente maior ao volume do gasto, em relação a uma curva que ajusta a média dos gastos em saúde de todos os 48 países. Isto fica ilustrado nos dois gráficos da seguinte forma: os pontos que representam os países que estão acima da curva de ajuste, estariam na zona de eficiência dos respectivos gráficos, ocorrendo o inverso com aqueles que se situam abaixo da curva.

  


























Algumas Considerações sobre a Metodologia e os Resultados do Índice de Eficiência


Embora o Indicador de Esperança de Vida ao Nascer possa sintetizar a trajetória da probabilidade de morrer de uma determinada população ao longo do ciclo de vida, ele poderia não ser o melhor indicador de eficiência para a análise de sistemas de saúde. A esperança de vida saudável, que calcula os anos de vida perdidos pela mortalidade (os chamados YLLs na metodologia de cálculo dos DALYs) mas também pela morbilidade (os YDLs, de acordo com a mesma metodologia) seriam mais representativos porque abarcariam todas as dimensões do que pode resolver um sistema de saúde.

Ao mesmo tempo, indicadores como gastos de saúde em relação ao PIB ou o gasto per-capita em saúde, refletem custos e complexidades culturais e organizacionais dos sistemas de saúde que representam formas de relacionamento entre todos os atores envolvidos direta ou indiretamente na produção de bens e serviços de saúde. Portanto, nem sempre os dados refletem uma medida comparável de eficiência dos sistemas de saúde nos países, mas também indicam quanto a população ou o governo estariam dispostos a pagar ou a financiar para o funcionamento destes sistemas.

Mas mesmo que se tenha que considerar de forma relativa a metodologia utilizada, é inegável que os dados mostram que países como o Brasil e os Estados Unidos, por motivos diversos, se encontram abaixo da linha de eficiência do seu gasto em saúde e isto não é uma novidade. Nos Estados Unidos, é necessário incluir mais pessoas ao sistema com custos menores e isso se pode corrigir através das novas regulações que vem sendo implementadas pelo Plano Obama.

No caso do Brasil, as ineficiências estão na forma como se regula e se administra o gasto público e na falta de uma articulação eficiente entre o SUS e os planos de saúde. Um gasto eficiente do SUS poderia reduzir a elevada proporção dos gastos em saúde das famílias e incluir aqueles que ainda não colhem os frutos dos 25 anos de existência do SUS, como é o caso  dos órfãos do Programa de Saúde da Família. Uma melhor integração entre o SUS e os planos de saúde permitiria minimizar as ineficiências e dar opções  para aqueles que não encontram uma atenção adequada, fazendo com que o setor público também venha a ter flexibilidade e condições para aumentar sua competitividade e eficiência na busca da preferência pelos cidadãos.