segunda-feira, junho 28, 2021

Covid-19 - A Dança das Variantes

 Ano 15, No. 120, Junho de 2021

Andre Medici

 

Por que ocorrem mutações e variantes no Covid-19?

Variantes de vírus do tipo RNA, como é o caso do Coronavírus estão associadas a mutações nos genes que o compõe, dado que a natureza deste tipo de vírus, quando encontra um ambiente favorável à reprodução, é evoluir e mudar gradualmente de acordo com as condições existentes, especialmente quando ocorrem separações geográficas entre as novas regiões para onde o vírus foi e as regiões de origem do vírus. Essas mutações podem afetar a natureza do processo de imunização. Por exemplo, mutações nos vírus da influenza, que também é do tipo RNA, levam à necessidade de produzir, a cada ano, uma vacina que seja eficaz para os diversos vírus gripais que estão ocorrendo naquele ano.

A melhor forma de evitar que haja novas variantes do Coronavírus é impedir a sua propagação, o que pode ocorrer de duas formas:

(a) através de processos que evitem o contágio e a disseminação rápida do vírus pelo contacto interpessoal sem proteção ou barreiras, como máscaras, lavagem constante de mãos e distanciamento social, ou;

(b) através de processos de imunização, que permitem interromper a transmissibilidade do vírus em determinada região quando se atinge um nível de imunidade, marcado por uma cobertura de pessoas totalmente vacinadas entre 70% a 85% da população (isto é, com duas doses após 15 dias da segunda dose, no caso da maioria das vacinas existentes)[i].

Se nenhum desses processos ocorrem, o vírus continuará a se propagar e as mutações geradoras de novas variantes, muitas vezes mais resistentes ou de mais fácil transmissão, são apenas uma resultante da adaptação do vírus aos novos ambientes num contexto de alta transmissibilidade.

Segundo o Dr. Paul Rothman, decano da Faculdade de Medicina da Universidade Johns Hopkins[ii], novas variantes do Covid-19 (ou SARS-CoV-2) são detectadas todas as semanas e a maioria não se desenvolve. Algumas persistem, mas não se tornam comuns. Outras passam a ser frequentes por algum tempo e desaparecem, e outras, mais persistentes, ficam por mais tempo. Até março de 2020 já haviam sido registradas mais de mil variantes do Covid-19, mas nenhuma delas tem sido, até o momento, suficientemente marcante para levar a mudanças nas estratégias utilizadas para a prevenção ou tratamento dos casos leves e até mesmo graves de Covid-19.

Quanto aos efeitos das mutações, algumas levam o vírus a se disseminar mais rápido de pessoa, resultando em mais infecções e, consequentemente, em mais mortes. No caso do Reino Unido, por exemplo, a variante que surgiu ao final de 2020 está associada a uma maior severidade dos casos. Outras variantes podem reduzir a eficácia das vacinas existentes, levando a necessidade de mudanças na composição das vacinas, o que pode ser um processo demorado e custoso. Isso revela a importância de aumentar os testes e estudos de sequenciamento genético dos vírus encontrados nas populações contaminadas para acompanhar o surgimento das variantes, avaliar seus efeitos e conter a sua disseminação.

 

Tipos de Variantes do SARS-CoV-2

A primeira variante do Covid-19 que despertou a atenção dos sistemas de saúde, foi detectada no sudeste do Reino Unido em setembro de 2020. Essa variante, agora conhecida como B.1.1.7, rapidamente se tornou a versão mais comum do coronavírus naquele e em outros países, sendo responsável por cerca de 60% dos novos casos de Covid-19 no Reino Unido em dezembro de 2020. Ainda hoje, é a forma predominante do coronavírus em alguns países. Diferentes variantes surgiram na África do Sul, Brasil, Califórnia e, mas recentemente, Índia. No caso da África do Sul, a nova variante pode ter a capacidade de reinfectar pessoas que se recuperaram de versões anteriores do coronavírus. Também pode ser mais resistente a algumas das vacinas aplicadas em distintos países.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) e outras instituições, como os Centers for Diseases Control and Prevention (CDC) dos Estados Unidos, classificam as variantes genéticas de um vírus de três formas: (i) variantes de interesse; (ii) variantes de preocupação e; (iii) variantes de alta consequência[iii].

As variantes de interesse são aquelas que podem (mas ainda sem comprovação) estar associadas a impactos em diagnósticos, tratamentos ou eficácia das vacinas, interferência nos teste de diagnóstico, susceptibilidade diminuída em uma ou mais classes de terapias utilizadas para o tratamento, redução significativa da neutralização por anticorpos, gerados durante a infecção anterior ou por processos de vacinação, redução da proteção induzida por vacina contra casos graves da doença, maior transmissibilidade e aumento da gravidade da doença.

As variantes de alerta são aquelas aonde há evidência de aumento da transmissibilidade, geração de doença mais grave (por exemplo, aumento de hospitalizações ou mortes), redução significativa da neutralização por anticorpos gerados durante infecção ou vacinação anterior, redução na eficácia dos tratamentos ou das vacinas e falhas de detecção dos diagnósticos. Elas requerem uma ou mais ações de saúde pública e esforços locais ou regionais para controlar a disseminação, aumento de testes ou pesquisas para determinar a eficácia das vacinas e até mesmo tratamentos específicos para neutralizar a variante. Com base nas características de cada variante, considerações adicionais podem incluir o desenvolvimento de novos diagnósticos ou a modificação de vacinas, tratamentos ou terapias.

As variantes de alta consequência são aquelas onde há registros comprobatórios e sistematizados de que houve uma grande redução na eficácia na imunização, prevenção ou tratamento das sequelas do Covid-19 trazidas por variantes do Coronavírus. Elas podem estar associadas a falhas demonstradas de diagnóstico, evidências de redução significativa na eficácia das vacinas, número desproporcionalmente alto de casos graves em pessoas que foram vacinadas, suscetibilidade significativamente reduzida às terapêuticas existentes e considerável aumento de hospitalizações. Uma variante de alta consequência exigiria notificação à OMS, de acordo com o Regulamento Sanitário Internacional e o anúncio, por parte dos governos, de estratégias para prevenir ou conter a transmissão, além de recomendações e ações concretas para atualizar tratamentos e vacinas.

Até o presente momento ainda não foram registradas variantes para a SAR-CoV2 que possam ser classificadas como de alta consequência, mas existem alguns casos de variantes de interesse e de variantes de alerta, como pode ser visto na tabela 1, que lista as principais variantes do Covid-19 registradas até junho de 2021.

Tabela 1 – Principais variantes do SAR-CoV2 identificadas até junho de 2021

Quando Apareceu

Código-Classificação

Aonde Apareceu

Efeitos

Mar, 2020

B.1.525 ou Variante Eta (Interesse)

Múltiplos Países

Redução potencial na neutralização por tratamentos com anticorpos monoclonais; Redução potencial na neutralização por soros convalescentes e pós-vacinação.

Abr, 2020

P.2 ou Variante Zeta

(Interesse)

Brasil

Redução potencial na neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Neutralização reduzida por soros pós-vacinação.

Mai, 2020

B.1.351 ou Variante Beta

(Alerta)

África do Sul

Transmissão aumentada em cerca de 50%; Suscetibilidade significativamente reduzida à combinação de tratamento com bamlanivimabe e etesevimabe monoclonal, mas outros tratamentos com anticorpos monoclonais estão disponíveis; Neutralização reduzida por soros convalescentes e pós-vacinação;

Set, 2020

B.1.1.7 ou Variante Alfa

(Alerta)

Reino Unido

Transmissão aumentada em cerca de 50%; Potencial gravidade aumentada com base em hospitalizações e taxas de letalidade;

Nenhum impacto na suscetibilidade aos tratamentos com anticorpos monoclonais; Impacto mínimo na neutralização por soros convalescentes e pós-vacinação;

Out, 2020

B.1.526.1

(Interesse)

Nova York, EUA

Redução potencial na neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Redução potencial na neutralização por soros convalescentes e pós-vacinação;

Out, 2020

B.1.617.2 ou Variante Delta

(Alerta)

Índia

Transmissibilidade aumentada; Redução potencial na neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Redução potencial na neutralização pelo soro pós-vacinação.

Out, 2020

B.1617.3

(Interesse)

Índia

 

Redução potencial na neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Neutralização reduzida por soros pós-vacinação.

Nov, 2020

B.1.526 ou Variante Iota (Interesse)

Nova York, EUA

Suscetibilidade reduzida à combinação de tratamento com bamlanivimabe e etesevimabe monoclonal. No entanto, as implicações clínicas disso não são conhecidas. Estão disponíveis tratamentos alternativos com anticorpos monoclonais.

Neutralização reduzida por soros convalescentes e pós-vacinação

Nov, 2020

P.1 ou Variante Gama

(Alerta)

Manaus, Brasil

Suscetibilidade significativamente reduzida à combinação de tratamento com bamlanivimabe e etesevimabe monoclonal, mas outros tratamentos com anticorpos monoclonais estão disponíveis;

Neutralização reduzida por soros convalescentes e pós-vacinação.

Dez, 2020

B.1.525 (Interesse)

Reino Unido e Nigéria

Redução potencial na neutralização por tratamentos com anticorpos monoclonais; Redução potencial na neutralização por soros convalescentes e pós-vacinação.

Abr 2021

B.1.617.1 ou Variante Kappa

(Interesse)

Índia

Redução potencial na capacidade de neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Redução potencial na neutralização por soros pós-vacinação.

Jan, 2021

P.3 ou Variante Theta (Interesse)

Filipinas

Redução potencial na capacidade de neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Redução potencial na neutralização por soros convalescentes e pós-vacinação.

Fev, 2021

B.1.617

(Interesse)

Índia

Redução potencial na capacidade de neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Neutralização reduzida por soros pós-vacinação.

Mar, 2021

B.1.427 ou Variante Épsilon

(Alerta) (*)

California, EUA

Transmissão aumentada em cerca de 20%; Diminuição modesta da suscetibilidade à combinação de bamlanivimabe e etesevimabe; no entanto, as implicações clínicas dessa diminuição não são conhecidas. Estão disponíveis tratamentos alternativos com anticorpos monoclonais; Neutralização reduzida por soros de convalescença e pós-vacinação;

Mar, 2021

B.1.429, também identificada como variante Épsilon (Alerta) (*)

California, EUA

Transmissão aumentada em cerca de 20%; Suscetibilidade reduzida à combinação de bamlanivimabe e etesevimabe; no entanto, as implicações clínicas dessa diminuição não são conhecidas. Estão disponíveis tratamentos alternativos com anticorpos monoclonais;

Neutralização reduzida por soros de convalescença e pós-vacinação.

Abr 2021

B.1.617.1 ou Variante Kappa

(Interesse)

Índia

Redução potencial na capacidade de neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Redução potencial na neutralização por soros pós-vacinação.

Abr 2021

B.1.1.28.2 P2

(Interesse)

 

Índia

Maior risco de pneumonia e perda de peso, infectando os órgãos respiratórios, incluindo os pulmões.

Jun 2021

C.37 ou Variante Lambda

(interesse)

Peru

Redução potencial na capacidade de neutralização por alguns tratamentos com anticorpos monoclonais; Redução potencial na neutralização por soros pós-vacinação.

Fonte: Elaboração do autor com base em dados do CDC e da Organização Mundial da Saúde (OMS). (*) Variáveis consideradas de interesse para a OMS, mas de alerta para o CDC.

Até o presente momento, apenas quatro mutações no Coronavirus foram classificadas pela OMS como “variantes de alerta”. São elas B.1.1.7 (Reino Unido)[iv], B.1.351 (África do Sul), P.1 (Brasil) e B.1.617.2 (Índia). O CDC dos Estados Unidos considera que as duas variantes californianas (B.1.427 e B.1.429) devem ser classificadas como variantes de alerta para efeitos das providências de saúde pública a serem tomadas nos Estados Unidos.

 

A quantificação das variantes nos distintos países

Não existe até agora uma contagem de qual a proporção dos casos associados a variantes sobre o total de casos de Covid-19 existentes em cada país. A OMS, em seu boletim epidemiológico de 22 de junho de 2021[v], contabilizava a situação das variantes de alerta, destacando que a variante alfa (B.1.1.7) era a que apresentava maior frequência, estando presente em 170 países. Em seguida, estaria a variável Beta (B.1.351) que estaria presente em 119 países. As variantes mais recentes, como a Delta (B.1617.2) e a Gama (P.1) estariam presentes em 85 e 71 países, respectivamente.

Cerca de 33 países registraram a presença das 4 variantes de alerta consideradas pela OMS. Na América Latina estes países são Argentina, Brasil e México. Mesmo assim, a OMS ressalta a necessidade de tomar estes dados com cautela, dado que muitos países não detêm os mecanismos de sequenciação genômica que permitam identificar quais são as variantes dominantes nos casos de Covid-19.

Poucos países conseguem calcular o impacto destas variantes no total de casos e mortes por coronavirus, mas alguns dos que detém melhores sistemas de registro e avaliação de casos, bem como processos de amostragem e testagem por sequenciação genética, permitem fornecer alguma estimativa de impacto.

No caso dos Estados Unidos, por exemplo, o CDC criou o Programa Nacional de Vigilância Genômica para identificar novas e emergentes variantes do SARS-CoV-2 e, desta forma, estimar quais as implicações para os diagnósticos, tratamentos e vacinas do Covid-19 que seriam autorizados para uso no país. O monitoramento da disseminação de variantes emergentes se baseia em processos de sequenciamento rápido e generalizado, através da contratação de laboratórios de diagnóstico privados, conjuntamente com uma parceria com a associação de laboratórios públicos norte-americana (APHL). A colaboração do CDC com os laboratórios permitiu estabelecer um sistema de vigilância de base populacional que produz dados sistemáticos sobre o sequenciamento genético das variantes de Covid-19 no país.

Com base nesses dados, sequências com alterações genéticas semelhantes associadas a eventos epidemiológicos e biológicos importantes são agrupadas em linhagens. Uma linhagem viral é um grupo de vírus definido por uma variante fundadora e seus descendentes. A proporção de linhagens que circulam nos Estados Unidos é rastreada e caracterizada para determinar se são consideradas variantes de alta consequência, variantes de alerta ou variantes de interesse. Esses dados, juntamente com dados de muitas outras fontes, são usados ​​para informar as ações de saúde pública nacionais e estaduais relacionadas às variantes.

Como demonstra o gráfico 1, 60,3% dos novos casos de Covid-19 nos Estados Unidos entre maio e junho de 2021 estavam associados a variante Alfa (P.1.1.7), seguidos de casos da variante Gama P.1 (11,2%), das variantes Delta B.1.617.2 (9,5%), e Iota B.526 (9,3%), sendo as demais variantes menos significativas 

       Fonte: CDC (Junho 2021)

 As vacinas protegem contra as novas variantes?

A falta de informação sistemática impede que se tenha uma resposta definitiva sobre esta pergunta. No entanto, vale a pena fazer algumas digressões com base no que tem sido divulgado em termos de estudos e análises em distintos países. Pode-se dizer que, em geral, as vacinas existentes protegem os indivíduos contra o Covid-19 em quatro circunstâncias: (i) doença grave; (ii) doença sintomática (ou casos leves); (iii) infecção, e (iv) infecção assintomática. Mas quando há variantes, os níveis de proteção podem ser menores e a OMS avalia ainda um quinto elemento que é o impacto de cada variante na neutralização do processo de vacinação completa.

As evidências coletadas até o momento mostram que, em geral, as vacinas existentes para o Covid-19 tendem a ser mais eficazes contra casos mais graves, como morte, do que contra casos leves e infecções assintomáticas. Ainda que os dados sejam incompletos, o último boletim da OMS (22 de junho de 2021) permite realizar as seguintes análises por vacina, considerando as variantes de alerta.

Pfizer-BioNTech-Comirnaty – A tabela 2 mostra que embora ainda existam áreas aonde não há suficiente evidência, a vacina da Pfizer parece liderar o ranking de eficiência contra as novas variantes, como pode ser visto na tabela abaixo, baseada em informações classificadas pela OMS em estudos desenvolvidos em vários países.              

Tabela 2 – Perda de eficiência da Vacina da Pfizer em cada uma das variantes de Alerta segundo o Tipo de Agravo da Covid-19

Tipo de Agravo

Variante Alfa (B.1.1.7)

Variante Beta (B.1.351)

Variante Gama (P.1)

Variante Delta (B.617.2)

Doença Grave                                

Nenhuma ou mínima

Nenhuma ou    mínima

-

Nenhuma ou      mínima

Doença Leve 

Nenhuma ou mínima

-

Nenhuma ou mínima

Nenhuma ou     mínima

Infecção Sintomática

Nenhuma ou mínima

Moderada

Nenhuma ou mínima

Nenhuma ou     mínima

Infecção  Assintomática

Nenhuma ou mínima

-

-

Mínima ou    moderada.

Impacto na neutralização da vacinação completa

Nenhuma ou mínima

Mínima a    substancial

Mínima ou moderada

Mínima ou    moderada

Fonte: OMS, junho de 2021. As áreas em branco correspondem a células sem informação ou sem suficiente evidência

Moderna- mRNA- 1273 – A tabela 3 mostra que não há informação ou a informação existente é insuficiente para avaliar a resposta da vacina Moderna em todas as variantes, mas em relação a proteção para o contágio de uma nova infecção pelas novas variantes, o nível de eficácia é similar ao da Pfizer em relação às variantes Alfa, Beta e Gama.

 Tabela 3 – Perda de eficiência da Vacina da Moderna em cada uma das variantes de Alerta segundo o Tipo de Agravo da Covid-19

Tipo de Agravo

Variante Alfa (B.1.1.7)

Variante Beta (B.1.351)

Variante Gama (P.1)

Variante Delta (B.617.2)

Doença Grave

-

-

-

-                                          

Doença Leve

-

-

Nenhuma ou mínima

-                 

Infecção Sintomática

-

-

-

-                                          

Infecção Assintomática

-

-

-

-                                         

Impacto na neutralização da vacinação completa

Nenhuma ou mínima

Mínima a substancial

Mínima a moderada

-

Fonte: OMS, junho de 2021. As áreas em branco significam sem informação ou suficiente evidência

AstraZeneca-Vaxzevria: A tabela 4 mostra que a vacina da AstraZeneca ainda tem muitas lacunas no processo de avaliação, mas parece ter bons impactos no que se refere a evitar doença grave na Variante Delta, tendo também pouca perda de eficiência nas variantes Alfa e Gama. Os dados em relação ao impacto na neutralização da vacinação completa mostram que a AstraZeneca protege os indivíduos vacinados mais em relação à Variante Alfa do que as variantes Beta e Gama, embora o impacto seja elevado no que se refere a Variante Delta, com perdas substanciais de efetividade

Tabela 4 – Perda de eficiência da Vacina da AstraZeneca em cada uma das variantes de Alerta segundo o Tipo de Agravo da Covid-19

Tipo de Agravo

Variante Alfa  (B.1.1.7)

Variante Beta(B.1.351)

Variante Gama  (P.1)

Variante Delta (B.617.2)

Doença Grave

-

-

-

Nenhuma ou       mínima

Doença Leve

Nenhuma ou mínima

-

Nenhuma ou mínima

Moderada

Infecção Sintomática

-

-

-

Nenhuma ou       mínima

Infecção Assintomática

Moderada ou substancial

-

-

-

Impacto na neutralização da vacinação completa

Mínima ou moderada

Mínima a substancial

Nenhuma ou mínima

Substancial (uma dose)

Fonte: OMS, junho de 2021. As áreas em branco significam sem informação ou suficiente evidência

Sinovac-Coronavac: No caso da Coronavac (Tabela 5), há escassa avaliação do impacto das variantes, segundo os dados da OMS, sendo que somente há mais informação relacionada a Variante Gama, com origem no Brasil, mostrando nenhum ou mínimo impacto. Com relação ao impacto das variantes na neutralização, a Coronavac parece dar boa resposta nos casos das variantes Alfa, Beta e Gama, mas não há ainda nenhuma avaliação relacionada ao impacto da variante delta, que parece estar crescendo no país recentemente.

Tabela 5 – Perda de eficiência da Vacina da Coronavac em cada uma das variantes de Alerta segundo o Tipo de Agravo da Covid-19

Tipo de Agravo

Variante Alfa (B.1.1.7)

Variante Beta (B.1.351)

Variante Gama (P.1)

Variante Delta (B.617.2)

Doença Grave                                           

-

-

-

-

Doença Leve

-

-

Nenhuma ou mínima

-

Infecção Sintomática

-

-

Nenhuma ou mínima

-

Infecção Assintomática               

-

-

-

-

Impacto na neutralização da vacinação completa

Nenhuma ou mínima

Nenhuma ou mínima

Nenhuma ou mínima

-

Fonte: OMS, junho de 2021. As áreas em branco significam sem informação ou suficiente evidência

Os dados da OMS também analisam alguns escassos resultados encontrados para outras cinco vacinas: (i) Novavax-Covavax, (ii) Janssen Ad26, (iii) Bharat Covaxin, (iv) Anhur ZL-Recombinant and (v) Ganaleya-Sputinik. Os resultados encontrados ainda que bastante incompletos, podem ser avaliados nos dados publicados pela OMS em 22 de junho de 2021.

A maior preocupação da OMS, no presente momento, está relacionada ao crescimento da Variante Delta, mas estudos realizados no Reino Unido por Lopez Bernal et al (2021)[vi] sobre os resultados de cursos completos das vacinas Pfizer e AstraZeneca contra doença sintomática/casos leves de Covid-19 associados a esta variante, revelaram uma eficácia de 88% e 67%, respectivamente. Outros estudos, realizados por Stowe et al[vii] sobre a eficácia do ciclo completo de vacinas contra doença grave (hospitalização) entre pessoas 16 anos ou mais anos no Reino Unido, mostram uma eficácia da Pfizer de 96% e 95% em relação as variantes Alfa e Delta, e uma eficácia da AstraZeneca de 92% e 86% contra estas mesmas variantes, respectivamente. Estudo realizado na Escócia por Sheikh et al (2021)[viii] descobriu que duas doses da Pfizer tiveram eficácia de 83% e 79% na proteção contra doença sintomática (casos leves) e infecção devido a Variante Delta, respectivamente, entre pessoas de 15 anos ou mais, e de 92% e 92% para a Variante Alfa, nestes dois tipos de proteção, respectivamente.

 

As variantes do Covid-19 circulando no Brasil

No Brasil ainda há uma grande escassez de estudos de sequenciação genética que permitam mapear todas as variantes do Covid-19 existentes no país. Além do mais, dada sua vasta extensão territorial, seria difícil ter uma estatística representativa das variantes existentes em cada Estado para dar um valor que represente a realidade nacional.

Em 16 de junho último, o Instituto Butantã, órgão de produção de vacinas e estudos sorológicos do Estado de São Paulo, fez um mapeamento genômico, identificando a presença de 19 variantes do Coronavírus em circulação entre a população do Estado. A principal variante encontrada foi a P1, representando 89% dos casos registrados, seguida das variantes B.1.1.7 (4.2%) e B.1.1.28 (3,5%). As demais variantes detêm somente 3,3% dos casos. Até aquela data não havia confirmação da circulação em São Paulo da variante Delta, originária da Índia e considerada pela OMS como até 80% mais contagiosa que as demais. O resultado da pesquisa do Butantã foi baseado na análise de mais de 4 mil amostras de testes positivos para Covid-19 sequenciados por laboratórios públicos e privados.

Recentemente, o Brasil tem sido fonte de preocupação internacional como celeiro de novas variantes do Covid-19. Sendo o país que atualmente congrega o maior número de casos diários, o Brasil parece ser atualmente o epicentro da transmissão do Covid-19 ao nível internacional. Enquanto a maioria dos países parece ter seguido as medidas restritivas para conter novos surtos pandêmicos, o Brasil tem sofrido para aplicar estratégias básicas de controle da transmissão, dado que a população não aderiu às mesmas e o compromisso federal com um processo sustentado de controle da pandemia tem sido, ao longo de boa parte do período pandêmico, negligenciado. Isso tudo, associado ao lento processo de vacinação, poderá levar a continuidade no aumento da proliferação do vírus e ao surgimento de cepas novas e modificadas nos próximos meses.

A situação em que o país se encontra em termos de taxas semanais de contaminação (número de casos) e de morte, mostra um processo de descontrole e um crescimento do risco pandêmico, ao contrário do que ocorre em outras partes do mundo. Caso o governo não consiga se comprometer com o aumento da testagem da população e a compra e entrega rápida de um contingente substancial de vacinas para acelerar o processo de imunização, a dança das variantes poderá se perpetuar ainda mais no país.


Notas

[i] Ver https://health.clevelandclinic.org/how-much-of-the-population-will-need-to-be-vaccinated-until-the-pandemic-is-over/. Esta proporção é diferente da necessária para a imunização contra a influenza, onde a proporção de população a ser vacinada para garantir imunidade de rebanho se encontra entre 33% e 44%.

 [ii] Ver https://www.hopkinsmedicine.org/health/conditions-and-diseases/coronavirus/a-new-strain-of-coronavirus-what-you-should-know

 [vi] Lopez Bernal J, Andrews N, Gower C, et al. (2021) Effectiveness of the Pfizer-BioNTech and Oxford-AstraZeneca vaccines on covid-19 related symptoms, hospital admissions, and mortality in older adults in England: test negative case-control study. BMJ (Clinical research ed). 2021;373: n1088-n1088. doi:10.1136/ bmj. n1088.

 [vii] Stowe J, Andrews JR, Gower C, et al (2021), Effectiveness of COVID-19 vaccines against hospital admission with the Delta variant - Public library - PHE national - . https://khub.net/web/phe-national/public-library/-/document_library/v2WsRK3ZlEig/view/479607266

 [viii] Sheikh A, McMenamin J, Taylor B, Robertson C. (2021) SARS-CoV-2 Delta VOC in Scotland: demographics, risk of hospital admission, and vaccine effectiveness. The Lancet, 2021;0(0). doi:10.1016/S0140-6736(21)01358-1.

Nenhum comentário: