Ano 15, No. 121, Julho de 2021
André Cezar Medici[i]
Introdução
Inflação, como todos sabem, é uma média
ponderada da variação de preços e quantidades compradas de bens e serviços,
entre dois períodos de tempo, e sua utilização sempre apresenta distorções
quando se comparam os índices de inflação com os gastos realmente incorridos
por indivíduos, famílias e empresas. Isto porquê cada agente econômico (empresa,
família ou governo), dependendo do que e de quanto gasta, tem uma inflação
específica e diferenciada em relação àquela média. Por isso, a inflação real
nunca é a mesma para cada setor de atividade, região ou família, e poderíamos
citar uma miríade de variáveis que dificultam ter uma taxa de inflação que
possa medir o que realmente se passa no bolso de cada um.
As métricas de inflação buscam registrar
variações de preços e quantidades de uma cesta de bens e serviços que são
utilizados para a produção intermediária (insumos, bens de capital, etc.), para
a venda no atacado, ou para a venda destinada ao consumo final das famílias[ii].
Os bens e serviços que compõe essa cesta, bem como as quantidades consumidas
pelas empresas (para a produção), pelos revendedores (para a venda no atacado) ou
pelos consumidores finais (varejo) são levantados periodicamente através de
pesquisas de orçamentos das famílias ou da composição de custos das empresas para
incluir novas preferências dos consumidores ou necessidades técnicas de produção
e eliminar ou reduzir o peso dos bens e serviços que deixam de ser consumidos
ou passam ser utilizados em menor escala pelas famílias ou pelos produtores.
Dadas estas características, existem vários
índices de preços que foram construídos para atender diferentes finalidades.
Neste particular, podemos classificar esses índices como: (i) aqueles
relacionados ao consumo final ou os índices de preços ao consumidor;
os quais medem a inflação para indivíduos ou famílias; (ii) aqueles
relacionados à produção ou os índices de preços aos produtores,
os quais refletem a variação nos custos para a produção de bens ou serviços em
geral ou de um determinado setor de atividade e; (iii) os chamados Índices
Gerais, que buscam combinar, de acordo com os pesos da demanda
intermediária ou final, as variações de preços e quantidades que ocorrem
simultaneamente na produção e no consumo .
(i) Índices de Preços ao Consumidor - No Brasil, por exemplo, existem índices voltados para medir como a inflação afeta o consumo final dos indivíduos ou famílias. É o caso do índice de preços ao consumidor (IPC) da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) da Universidade de São Paulo (USP), que foi criado há muito tempo pela Prefeitura Municipal de São Paulo[iii], com o objetivo de reajustar os salários dos servidores municipais. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) calcula vários índices de preços relacionados ao consumo final, destacando-se o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) o qual era, até pouco tempo, o índice que corrigia os reajustes de salários no Brasil, e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) o qual, mede a variação dos preços para quem tem renda de até 40 salários mínimos, e tem sido utilizado como o indice oficial da inflação no Brasil.
(ii) Índices de Preços aos Produtores – Existem no Brasil vários índices setoriais de produção, ou índices de preços aos produtores, que calculam a inflação específica decorrente da produção geral ou em cada setor de atividade. Podemos dizer que, atualmente, cada setor de atividade calcula seu índice específico ao produtor. O Índice de preços por atacado da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e o índice geral mais conhecido e, como exemplo de índices setoriais temos o Índice de Construção Civil (ICC) da FGV, que reflete as variações nos custos desse setor específico e tem 10% do peso no total do Índice Geral de Preços (IGP), também calculado pela FGV. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) produz, um Índice de Custo Industrial (ICI), de variação trimestral, que no momento se encontra em mudança de metodologia. Assim, cada setor de atividade busca ter seus próprios cálculos de inflação setorial e o setor saúde não foge a regra, dado que várias entidades privadas calculam Índices de Variação de Custos Médico Hospitalares (VCMH) para medir da produção de bens e serviços nesse setor.
(iii) Índices Gerais de Inflação. No Brasil, o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI) da FGV, criado em novembro de 1947, é o exemplo mais claro de um índice para balizar o comportamento geral dos preços da economia brasileira[iv]. Outro índice geral produzido pela FGV é o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M) o qual é tão antigo quanto o IGP-DI e tem sido utilizado na análise de operações financeiras de longo prazo[v]. Mas o índice geral de inflação recomendado internacionalmente é o chamado deflator implícito do Produto Interno Bruto (PIB), que considera um cálculo de variação de preços da economia de cada país em todos aspectos de consumo final, consumo intermediário, exportações menos importações, além de consumo e investimento do governo[vi].
Vale a
pena comentar que o deflator implícito do PIB é calculado pelo IBGE em base
trimestral, e tem a possibilidade de ser aberto para distintos setores de
atividade, o que atualmente já ocorre em alguns setores. Isto não afeta a
utilização deste deflator como base para uma correção anual dos preços
praticados no Brasil. No entanto, em coordenação com o IBGE, esforços
adicionais poderiam ser realizados para conseguir uma medição mensal do
deflator implícito do PIB e, até mesmo, uma maior abertura deste indicador para
setores específicos como o de saúde que vem aumentando sua participação no PIB
brasileiro.
Há pouca discussão sobre como se deve deflacionar os gastos públicos, especialmente porquê, em países como o Brasil, parte das compras do governo não se destinam somente a adquirir bens e serviços de consumo final, mas também a produzir estes bens e serviços, como é ocorre nos setores de saúde e educação, utilizando como insumos bens e serviços intermediários. Mas o efeito preço no cálculo da inflação dos gastos do governo não se expressa no consumo final desses bens e serviços, dado que a maioria deles não é comprada pelos consumidores, os quais os recebem do Governo gratuitamente sem que possam expressar suas preferências através do mercado.
O objetivo desta postagem é analisar o impacto
de distintos deflatores na análise dos gastos públicos federais com saúde no
Brasil, com um exemplo concreto de como estes deflatores podem representar
diferentes comportamentos no gasto público federal em saúde, entre 2012 e 2020.
As
distintas formas de medir a inflação no setor saúde
Assim como ocorre em outras áreas da produção
humana, selecionar o índice certo para medir variações de preços não é trivial
e a escolha pode acarretar em diferenças substanciais nas estimativas e
resultados encontrados. Por exemplo, os resultados de estimativas da inflação,
no setor saúde, podem ser muito diferentes quando se utiliza um índice geral de
inflação ao invés de um índice que reflita a inflação específica do setor.
Diferentes índices de preços em saúde podem ser
utilizados para finalidades distintas. Se o objetivo, por exemplo, é conhecer
como a quantidade de serviços médicos mudou ao longo do tempo em função dos
preços, se deveriam utilizar índices de preço dos produtores de serviços
médicos. Os índices de preço ao produtor são, em geral, os preferidos para
medir a variação das despesas totais de uma instituição de saúde (hospital,
rede de saúde, seguro de saúde, etc.) porque refletem as tendências nos valores
que se pagam aos distintos fornecedores de insumos e força de trabalho. No
entanto, se o objetivo é avaliar os gastos diretos das famílias com saúde, os
índices de consumo seriam os mais adequados, dado que refletem variações nos
preços pagos por estas e, se o índice de consumo for específico para bens e
serviços de saúde, este resultado ainda é mais fidedigno à realidade.
No entanto, quando se considera o gasto em
saúde como parte do gasto total de um país ou região, os índices gerais, entendidos
como média das variações de preços em todos os setores e de todos os agentes
econômicos, podem ser os mais adequados pela necessidade de haver uma
uniformidade no critério de mensuração da inflação em saúde com a dos demais
setores.
Em artigo recente, Dunn et al (2016)[vii]
considera que, ao nível macroeconômico, a melhor medida para avaliar os gastos
com saúde em termos de poder de compra da sociedade é o deflator implícito do
PIB. Como índice geral ele seria também, na falta de um indicador específico para
acompanhar a inflação em saúde, o melhor indicador para medir gastos
governamentais porque reflete a variação de um conjunto de bens e serviços voltados
para o consumo intermediário e final, tendo inclusive a abertura para medir a
variação dos gastos do governo.
No que se refere a medida do poder de compra
das famílias, os índices de preço ao consumo são os mais indicados pois dão a
dimensão da variação média da inflação na composição dos gastos da família. Mas
se o objetivo é medir somente o gasto em saúde das famílias (sem compara-lo com
o gasto em outros itens), se pode utilizar índices de preços ao consumo
específicos para os gastos em saúde, como é o caso do IPC-saúde da FIPE.
Para conhecer a variação dos custos associados
a uma doença específica, índices de preços ao produtor de serviço de saúde, ou
índices de inflação médica relacionados àquela doença, seriam os mais
adequados. Para saber como evoluíram os custos dos serviços de saúde gerais ou
de partes específicas (internação, por exemplo), os índices de preços ao
produtor de serviços de saúde (como os VCMH utilizados no Brasil) também seriam
os melhores indicadores.
Índices como o VCMH podem ser desenhados para
medir o custo de tratar pacientes com uma condição específica (diabetes tipo 2,
por exemplo) ao longo de um período de tempo onde se estabelece um ano base, a
cesta de bens e serviços relacionadas ao custo de tratar esta condição e o
somatório da variação dos preços (multiplicados pelas quantidades) dos itens
que compõe essa cesta ao longo do tempo.
Já a mensuração da inflação nos gastos públicos
de saúde mereceria tratamento particular. No caso dos Estados Unidos, por
exemplo, os Centros de Serviços do Medicare e Medicaid (CMS) corrigiram
os valores nominais das contas nacionais de saúde daquele país entre 2004 e
2011 através da utilização de um índice encadeado de preços que reflete os
gastos de distintos financiadores públicos e privados. Este índice utiliza duas
cestas combinadas para deflacionar os gastos: a de gastos pessoais de saúde e a
de gastos institucionais de saúde. A primeira corresponde aos critérios de
preços ao consumidor, medindo o valor total gasto para tratar indivíduos com
condições médicas específicas, como cuidados hospitalares, serviços médicos e
clínicos e medicamentos vendidos no varejo.
Já os gastos institucionais incluem o custo
líquido da administração dos seguros de saúde, os gastos públicos com
administração em saúde, os gastos do governo com saúde pública e os gastos com
investimentos públicos em pesquisa e desenvolvimento. O critério de
deflacionamento destes gastos é mais complexo, uma vez que estes não envolvem
transações de mercado entre indivíduos e empresas. Assim, ao invés de utilizar
um índice único de preços, os gastos institucionais são normalmente deflacionados
pela simples variação dos preços dos insumos subjacentes à execução destes
gastos, os quais refletem imperfeições no processo de formação de preços associados
aos gastos públicos em saúde.
Dessa forma, os gastos administrativos do
governo são deflacionados usando um índice composto de preços de insumos que
pondera, em cadeia, índices de preços associados a salários, benefícios,
honorários profissionais, serviços de processamento de reclamações, aluguéis de
escritórios e outras despesas. Esses índices, no caso dos Estados Unidos, são
agrupados separadamente para a administração de programas federais e programas
regionais (de estados e governos locais), refletindo processos
institucionalmente diferenciados de acordo com as esferas de governo. Mas em
geral, não existe uma fórmula mágica que atenda a uma medida acurada da
inflação dos gastos públicos em saúde, sejam eles agregados ou
sub-setorialmente desagregados.
Para dar uma visão sintética dos índices de
inflação utilizados para medir objetivos específicos de análise do setor saúde,
montamos a tabela abaixo:
Tabela 1 – Índices de inflação em
saúde utilizados de acordo com diferentes finalidades
Objetivos
da Análise de Preços |
Índices
Gerais |
Índices
de Preços ao Consumidor |
Índices
de Preços ao Produtor |
||||
Deflator Implícito
do PIB |
Índices
Agregados |
Geral |
Bens e
Serviços de Saúde |
Variação
de Custos Médico-Hospitalares |
Custos por Subsetor (Hospital, Atenção
Básica, etc.) |
Custos
por Doença, Patologia ou Linha de Cuidado |
|
Análise
Global dos Gastos de Saúde |
x |
x |
|
|
|
|
|
Análise dos Gastos Públicos com Saúde |
x |
|
|
|
|
|
|
Análise
dos Gastos das Famílias com Saúde |
|
|
x |
x |
|
|
x |
Análise dos
Custos de Hospitais e Redes |
|
|
|
|
x |
|
|
Análise
dos Custos de Subsetores de Saúde |
|
|
|
|
x |
x |
|
Análise dos Custos de Doenças Específicas |
|
|
|
|
|
|
x |
Fonte: Elaboração
do Autor
Considerações sobre como deflacionar gastos
públicos no Brasil
O governo brasileiro não utiliza explicitamente
nenhum critério para deflacionar os gastos públicos, embora o Banco Central e o
Ministério da Economia reconheçam o IPCA como o indicador oficial para
dimensionar a inflação no país, inclusive no que se refere a reajustes
governamentais. Mas seria essa uma decisão correta? As experiências internacionais para
deflacionar gastos públicos tendem a convergir no uso dos chamados índices de
preços agregados (como o deflator implícito do PIB) não utilizando índices de
preços ao consumidor (como o IPCA). Isto porque os índices agregados consideram
não apenas o impacto da inflação no consumo, mas também na produção, sendo uma
medida mais correta das variações ocorridas na economia e nos gastos do governo
como um todo.
Existe uma preferência internacional pelo uso
do deflator implícito do PIB, dado que este não é medido diretamente, mas sim a
partir de outros indicadores da economia, como a variação dos custos dos bens
usados pela administração pública (governo) e a formação bruta de capital fixo
(investimentos). Outros índices de gerais de inflação, como é o caso do IGP-DI
ou o IGP-M no Brasil, não contemplam para o cálculo da inflação os gastos públicos
e os investimentos, atendo-se apenas às variações de preços para a compra de
bens e serviços nos custos de produção e nos mercados de consumo.
Ao mesmo tempo, o deflator implícito do PIB, considera
apenas o impacto das variações de preços no valor adicionado. Isso altera o
tratamento que dá às importações, por exemplo, quando comparado ao Índice de
Preços por Atacado (IPA), que tem um peso de 60% na composição do IGP-DI ou do
IGP-M, já que, nestes índices, as variações cambiais são repassadas ao longo de
toda a cadeia produtiva até o consumidor final. Se o objetivo, neste caso, é
ter um índice de preço não afetado pela variação cambial que, no caso do
Brasil, por ser flutuante, poderia injetar tendências especulativas na medição
dos indicadores econômicos, a utilização do deflator implícito do PIB seria
melhor do que do IGP-DI ou IGP-M para corrigir as variações inflacionárias dos
gastos governamentais.
Mas o Banco Central tem utilizado o IPCA como
indicador para a correção das metas de inflação. Isto faz, por exemplo, com que
as correções do “teto de gastos” implementado pelo Governo desde 2017 tenha
também utilizado o IPCA como índice de correção do orçamento nominal dos
últimos anos, dado que as despesas, desde então, seguem sendo corrigidas por
este índice por coerência com o que determina o regime de metas de inflação.
Este critério pode, também, não ser o mais indicado.
Por ser mais abrangente em captar as transações
de toda a economia, o deflator do PIB seria melhor para corrigir os efeitos
inflacionários dos gastos públicos do que o IPCA. Mas ele tem apresentado, ao
longo dos anos, variações maiores do que o IPCA (ainda que menores do que o
IGP-DI) como pode ser visto no gráfico 1.
Fonte: FGV-IBRE, Banco Central do Brasil e IBGE.
Observa-se que entre 2012 e 2020 em apenas um ano (2015) as taxas de inflação medidas pelo IPCA foram superiores as do deflator implícito do PIB. Já no que se refere às taxas de inflação medidas pelo IGP-DI, pode-se observar que as maiores flutuações deste indicador, tanto em relação ao IPCA quanto ao deflator implícito do PIB, refletem fortes pressões nas taxas de câmbio, especialmente nos anos mais recentes onde, particularmente em 2020, a variação do IGP-DI foi de 23% comparada com 4,8% e 4,5% no deflator implícito do PIB e no IPCA, respectivamente. No acumulado entre 2012 e 2020, o IGP-DI teve uma inflação acumulada de 83%, comparada com a de 56%, medida pelo deflator implícito do PIB e 54%, medida pelo IPCA, no mesmo período respectivamente.
Os gastos públicos federais em saúde no Brasil
segundo distintos critérios de deflacionamento
Feitas estas considerações, caberia analisar
como evoluíram os gastos públicos federais com saúde entre 2012 e 2020. A série
de gastos públicos federais que será apresentada aqui corresponde ao conceito
de Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS)[viii]
e os dados básicos são da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) do Ministério da
Economia, embora tenham sido obtidos através da base de dados do Sistema de
Informação sobre Orçamentos Públicos de Saúde (SIOPS) do Ministério da
Saúde-DATASUS. A tabela 2 e o gráfico 2 mostram
a evolução destas despesas, em R$ bilhões médios de 2020 deflacionados pelo
IPCA, pelo deflator implícito do PIB e pelo IGP-DI.
Tabela 2 – Gastos Federais em Ações e Serviços
de Saúde Públicos de Saúde (ASPS) em R$ Bilhões de 2020 de Acordo a três
critérios de deflacionamento
Anos |
Gasto Federais com Saúde
corrigidos pelo deflator implícito do PIB |
Gastos Federais com Saúde
corrigidos pelo IPCA |
Gasto Federais com Saúde
corrigidos pelo IGP-DI |
2012 |
124.9 |
123.6 |
146.9 |
2013 |
123.2 |
121.1 |
144.4 |
2014 |
126.6 |
125.9 |
154.0 |
2015 |
128.1 |
123.8 |
151.5 |
2016 |
117.2 |
115.2 |
139.8 |
2017 |
131.0 |
129.7 |
162.8 |
2018 |
127.7 |
127.4 |
154.8 |
2019 |
128.1 |
127.8 |
150.5 |
2020 |
161.0 |
161.0 |
161.0 |
Fonte:
Dados do SIOPS- Ministério da Saúde
Fonte: Dados do SIOPS- Ministério da Saúde utilizando dados primários do STN/Ministério da Economia.
A utilização do Deflator Implícito do PIB, como índice geral de inflação, mostra a ocorrência da conhecida queda dos gastos em saúde pelo critério ASPS em 2016, a qual representa o ponto mais baixo da série de gastos durante toda a década, alcançando R$117 bilhões naquele ano. Os gastos voltam a se recuperar em 2017, mas caem ligeiramente entre este ano e 2019. A maior volume de gastos em saúde na década passada ocorre em 2020, quando o gasto alcança R$161 bilhões, embora estes gastos estejam fortemente influenciados pelos recursos adicionais relacionados ao combate da pandemia do Covid-19. Vale lembrar que a dotação orçamentária inicial para os gastos em saúde pelo critério ASPS em 2020 foi de R$124,3 bilhões, mas os gastos efetivamente realizados naquele ano foram de R$160,9 bilhões, indicando um acréscimo de R$36,6 bilhões relacionados à pandemia[ix].
IPCA
A utilização do IPCA, como índice de
inflação ao consumidor, leva a resultados no deflacionamento da série bastante
similares ao uso do deflator implícito do PIB, embora os critérios associados
aos dois índices sejam bem diferentes. Utilizando o IPCA, por exemplo
verifica-se que a queda nos gastos em saúde registrada entre 2015 e 2016 não
foi tão elevada quanto à relativa a utilização do outro deflator, da mesma
forma que o crescimento dos gastos entre 2016 e 2017 também não foi tão
acentuado. No entanto, as variações entre o IPCA e o deflator implícito do PIB
foram praticamente as mesmas entre 2019 e 2020. Dessa forma, os gastos federais
em saúde em 2020 também representam, no deflacionamento da série pelo IPCA, o
ponto mais elevado da série dadas as mesmas razões associadas à pandemia.
IGP-DI
A utilização do IGP-DI, outro índice geral de inflação, no deflacionamento dos gastos federais de saúde levaria a resultados totalmente diferentes no comportamento da série quando comparado com dois outros deflatores. Neste caso, observa-se uma queda bem acentuada nos gastos federais em saúde entre 2015 e 2016 (de R$151 para R$140 bilhões) da mesma forma que uma forte elevação entre 2016 e 2017, onde o gasto federal chega a R$163 bilhões e passa a ser o ponto mais elevado da série, mesmo quando comparado com 2020, quando os gastos federais com saúde alcançaram R$161 bilhões.
Ao ter um grande componente de preços por atacado e, dessa forma, incluir o comportamento da variação de preços de produtos importados consumidos internamente, o IGP-DI parece estar muito associado às flutuações cambiais, o que aparentemente não ocorre com o deflator implícito do PIB, onde a variação de preços se atem ao valor adicionado. De fato, o coeficiente de regressão linear (R2) entre a variação do câmbio nominal (US$-R$) e a variação do IGP-DI entre 2012 e 2020 foi de 0,5469, enquanto que entre a variação do câmbio nominal e do deflator implícito do PIB o R2 foi de 0,0666, ao longo do mesmo período, indicando uma maior aderência entre as duas primeiras variáveis do que entre as duas últimas. Para exemplificar, a variação do câmbio nominal em 2020 foi de 31% e a do IGP-DI foi de 23%, enquanto que as do deflator implícito do PIB e do IPCA foram de 4.8% e 4.5%, respectivamente.
Mas qual seria o peso das importações nos gastos públicos de saúde no Brasil? Este é um tema difícil de responder pois envolve conhecer a magnitude das importações enquanto investimento e consumo final do setor público de saúde, além de seu peso nos custos intermediários dos bens e serviços de saúde produzidos no país. A Associação Brasileira de Importadores e Distribuidores de Produtos para Saúde (ABRAIDI), entidade que em 2017 detinha 304 associados gerando mais de 13.600 empregos, com uma receita de R$ 5,5 bilhões, registrou vendas de cerca de R$ 1,35 bilhão em produtos para saúde ao SUS, o que representa apenas 1% dos gastos federais em saúde naquele ano[x].
Como conclusão parcial dessa análise dos índices de inflação gerais e de consumo, pode-se dizer que o uso do deflator implícito do PIB pode ser o mais indicado conceitualmente para deflacionar a série de gastos federais com saúde, mas não há muita diferença entre utilizar este indicador ou o IPCA, quando se observa o comportamento recente destes dois índices. A grande discrepância nos resultados do deflacionamento existe entre o uso do IGP-DI e dos outros dois indicadores mencionados, dado que o IGP-DI reflete pressões cambiais que muitas vezes podem distorcer a análise do que ocorre efetivamente com os preços internos e, mas especificamente, com a demanda final. No entanto, o peso de produtos importados nos custos finais e intermediários do setor saúde poderá, em algum momento, levar a outras considerações, como a necessidade de utilizar índices específicos de inflação setorial. Isso foi determinante no comportamento dos preços em saúde em 2020 que foram largamente influenciados pela importação de equipamentos, insumos, medicamentos e vacinas para o combate ao Covid-19.
Índices de Variação de Preços ao Consumidor e dos Custos Específicos do Setor Saúde no Brasil
Em quase todos os países do mundo os custos e a inflação associada ao setor saúde tem subido mais do que a inflação média. Vários fatores contribuem para este sentimento, destacando-se as mudanças demográficas que trazem um aumento da esperança de vida e do contingente de pessoas de terceira idade como proporção da população, a extensão da proteção à saúde como parte das políticas de universalização de cobertura – que hoje fazem parte dos objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) e a incorporação de tecnologia médica, não apenas na área de equipamentos médicos e terapias, mas também de medicamentos que, apesar de mais caros, trazem uma melhores resultados e o prolongamento da vida ativa e saudável das populações.
O Brasil, apesar de ter mergulhado nos últimos anos em mais uma década de crise e crescimento econômico pífio, também faz parte deste contexto de aumento da expectativa de vida e envelhecimento de sua população, assim como de suas consequências nos gastos de saúde. É de se esperar, portanto, que o efeito da inflação de saúde no bolso dos consumidores seja maior do que a inflação em saúde que tem impactado as famílias, como pode ser visto no gráfico 3, que compara as variações medias anuais IPC geral da FIPE para São Paulo com as relativas ao IPC específico do setor saúde da mesma instituição, entre 2013 e 2020.
Fonte: Universidade de São Paulo (USP), Departamento de Economia, Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE)
Verifica-se, em todos os anos, que a variação da inflação em saúde foi superior à inflação média. Segundo este indicador, a partir de 2017, a variação dos preços ao consumidor em saúde tem sido mais do dobro da variação dos preços em geral. Como o consumo de serviços de saúde é relativamente inelástico em relação aos preços, comparado com outros bens e serviços, a participação dos gastos em saúde no conjunto dos gastos das famílias tende a aumentar. Segundo as Pesquisas de Orçamentos Familiares (POF) do IBGE, os gastos de saúde das famílias aumentaram de 7,2% para 8,0% do total dos gastos das famílias entre 2008/9 e 2017/8.
Mas do lado da produção, pode-se dizer que as variações dos custos de saúde também têm sido ainda mais elevadas. Nas últimas duas décadas variações nos custos em saúde, de empresas ou de planos de saúde, têm sido medidas através de índices do tipo VCMH. As operadoras de planos de saúde[xi] e algumas federações de seguros de saúde[xii] calculam seus próprios VCMH, assim como empresas consultoras como a “Arquitetos da Saúde” e outras.
Embora a variação dos reajustes
permitidos pela ANS para os planos individuais, acumulada entre 2013 e 2018, tenha
sido de 100% - valor maior que a variação acumulada do IPC-saúde/FIPE no mesmo
período (88%) - a diferença de variação entre estes dois índices foi muito
pequena, o que mostra uma certa aderência entre o impacto da inflação da saúde
nos consumidores e os reajustes dos planos individuais. No caso do VCMH da AQS,
a variação negativa de 2020 coloca sua correção entre 2014 e 2018 (104%) praticamente
idêntica à variação dos reajustes acumulados dos planos individuais permitidos
pela ANS. Já no caso do VCMH do IESS, ainda não foi feita a revisão e correções
relativas ao ano de 2020.
Ainda que os planos individuais representem apenas um quinto do total de beneficiários da saúde suplementar no Brasil em 2021, pode estar havendo um represamento dos reajustes dos planos individuais em relação aos custos assistenciais. Se isto é verdade, há uma tendência de longo prazo no aumento da sinistralidade, dado que as despesas estariam crescendo a níveis mais altos do que a receita das operadoras. Esse fato pode ser ainda mais preocupante se considerarmos que há uma tendência no Brasil à redução dos beneficiários de planos de empresa e um aumento nos planos individuais.
Embora a maioria dos planos de saúde sejam coletivos, vem crescendo a participação dos planos individuais entre o total de beneficiários da saúde suplementar, os quais já chegam a 20% no início de 2021. Como os planos individuais tem tido um reajuste máximo autorizado pela ANS inferior aos índices VCMH, é possível que parte da diferença entre o comportamento do VCMH e do IPC-FIPE saúde esteja associada a um possível represamento no valor dos prêmios (não nos planos coletivos, mas nos individuais) por não repassar a totalidade dos custos médico-assistenciais para o reajuste dos prêmios dos planos individuais. O gráfico 5 mostra como evoluiu a variação dos VCMH do IESS e da “Arquitetos da Saúde”, bem como do IPC-Saúde da FIPE e o reajuste máximo dos planos individuais permitido pela ANS, entre 2014 e 2020.
Embora a variação dos reajustes permitidos pela ANS para os planos individuais, acumulada entre 2013 e 2018, tenha sido de 100% - valor maior que a variação acumulada do IPC-saúde/FIPE no mesmo período (88%) - a diferença de variação entre estes dois índices foi muito pequena, o que mostra uma certa aderência entre o impacto da inflação da saúde nos consumidores e os reajustes dos planos individuais. Mas a variação destes dois índices foi inferior às variações do VMCH-ARQ (124%) e do VCMH-IESS (191%). Portanto, ainda que os planos individuais representem apenas um quinto do total de beneficiários da saúde suplementar no Brasil em 2021, o represamento dos reajustes dos planos individuais em relação aos custos assistenciais poderia representar uma tendência de longo prazo no aumento da sinistralidade, dado que as despesas estariam crescendo a níveis mais altos do que a receita das operadoras. Esse fato pode ser ainda mais preocupante se considerarmos que há uma tendência no Brasil à redução dos beneficiários de planos de empresa e um aumento nos planos individuais.
No entanto, a conjuntura de 2020-2021 tem sido bastante atípica em função da pandemia do Covid-19. As medidas para evitar o contágio e maiores precauções dos usuários trouxeram uma redução nas taxas de utilização dos serviços cobertos pelos planos de saúde em 2020. Ao mesmo tempo, a necessidade da classe média ampliar suas opções de tratamento e não cair no caos oferecido pelo SUS, trouxe uma expansão de quase um milhão de novos segurados entre 2020 e 2021, depois da continua redução do número de beneficiários (em quase 3 milhões) entre 2014 e 2020 provocada pelo fraco desempenho da economia brasileira desde 2014.
A redução nas taxas de utilização dos planos em 2020 (refletida nas taxas de ocupação de leitos não-Covid nos hospitais) foi o resultado do comportamento dos usuários em postergar visitas a hospitais e ambulatórios para consultas agendadas, exames preventivos e emergências não associadas ao Covid-19, levando inclusive à diminuição no número de cirurgias eletivas e trazendo forte queda nas margens de rentabilidade dos principais hospitais privados do país, como aponta o informe do Observatório da Associação Nacional dos Hospitais Privados (ANAHP) de 2021[xiv]. Assim, com um aumento nas receitas de contribuição e uma redução das despesas médico-hospitalares, as operadoras de planos de saúde tiveram, ao contrário dos provedores de serviço, um aumento de rentabilidade, propiciando forte queda na sinistralidade dos planos de saúde ao longo de 2020. Tal fato levou a ANS, no dia 7 de julho último, a declarar um reajuste negativo dos planos de saúde para 2021[xv].
No entanto, a redução da sinistralidade pelas condições especiais trazidas pela pandemia pode ser efêmera, dado que a tendência ao aumento da sinistralidade dos planos de saúde está estabelecida no longo prazo a pelo menos duas décadas. A maioria dos planos de saúde não incorporou inovações gerenciais e administrativas que possam aumentar sua eficiência. Por este motivo, os planos seguem inercialmente sem negociar com os provedores novos mecanismos de pagamento associados a resultados e compartilhamento de riscos.
Caso as operadoras não revertam esta tendência a curto prazo, a ameaça financeira ao sistema de saúde suplementar aumentará progressivamente nos próximos anos, num contexto de instabilidade do emprego formal e crescimento dos planos individuais em relação aos planos empresariais. A reversão desta tendência, se por um lado requer uma maior flexibilidade das operadoras para implementar planos desenhados de acordo com as necessidades e possibilidades financeiras dos beneficiários, requer também uma reforma na gestão das operadoras, para que estas implementem programas de promoção e prevenção que revertam as tendências de longo prazo na utilização dos serviços, comecem a implementar sistemas de gestão baseados em valor e pagamentos dos serviços por resultado. A implementação de uma nova relação que permita uma maior integração entre os programas públicos e privados de saúde também será altamente positiva para reverter estas tendências. Outro risco que sofrem os planos de saúde nesse momento é o aumento de uma judicialização legislativa que retire a pouca flexibilidade que ainda permite mecanismos de negociação mais abertos para o desenho de opções dos planos de saúde mais próximas às necessidades e possibilidades de financiamento dos usuários.
A correção dos gastos federais de saúde por indicadores específicos de saúde.
Os gastos federais com saúde podem ser corrigidos, além dos indicadores de inflação gerais (deflator implícito do PIB) e do consumidor (IPCA) pelos indicadores específicos de saúde, tanto os de consumo (como o IPC-saúde da FIPE ou algo similar a ser obtido de tabulações do IPCA) ou de produção (como o VCMH). Existem argumentos pró e contra este tipo de iniciativa.
Os argumentos em favor se ligam ao fato de que o orçamento público federal de saúde tem um forte componente de compra ou prestação direta de serviços assistenciais, comprando insumos, remunerando trabalhadores e pagando diretamente ao setor privado ou filantrópico prestador de serviços. Neste sentido, o poder de compra do Ministério da Saúde ficaria reduzido quando aumentam os custos assistenciais e isso deveria ser levado em conta na elaboração anual dos orçamentos de saúde. Se os VCMH aumentam, eles não aumentam somente para os insumos comprados pelo setor privado, mas como resultado de todas as compras realizadas, tanto pelo setor público, como pelo setor privado.
Como argumento contrário, existe o fato de que o governo tem um grande poder de monopsonio ao comprar serviços ou insumos para o setor saúde e, sendo assim, pode ter a faculdade de determinar os preços e reduzir as margens dos fornecedores de insumos, equipamentos e medicamentos para preços que sejam favoráveis e, dessa forma, maximizar o resultado do orçamento público. Baseado neste argumento, se poderia dizer que índices gerais de inflação poderiam ser mais favoráveis para reajustar o orçamento de saúde.
Há ainda outros argumentos que tornam a escolha do critério de deflacionamento dos gastos públicos ainda mais confuso. No Brasil, temas como corrupção, super faturamento e propinas associadas às compras públicas do governo brasileiro não são exceções, mas sim a regra, o que reduz o poder de comprar de forma eficiente e maximizar os resultados do gasto público. O Ministério da Saúde (não só atualmente, mas há décadas) está longe de ser uma exceção às práticas de corrupção. Além disso, os volumes de recursos que se perdem por desvios de conduta e enriquecimento pessoal dos que passam pelos cargos públicos não são nada desprezíveis e afetam em larga escala os resultados dos recursos disponíveis pela ação do Governo.
Feitas todas essas ressalvas, como ficariam os gastos públicos federais em saúde, entre 2012 e 2020 se utilizarmos o IPC-Saúde da FIPE e o VCMH do IESS? O gráfico 6 mostra que as diferenças seriam de grandes proporções. Em ambos os casos, os gastos federais de 2012 seriam os maiores, embora haja um crescimento dos gastos em 2020 em relação a 2019, como resultado do aumento das despesas extraordinárias relacionadas à pandemia do Covid-19.
Fonte: IESS, IBGE e FIPE/USP.
Embora a utilização do IPC-Saúde da FIPE não seja o critério mais adequado, dado que os gastos públicos federais em saúde não são gastos de consumo das famílias, o uso do VCMH pode indicar uma perda progressiva de capacidade das compras públicas desde 2012, dado que o crescimento dos gastos nominais a partir deste período não conseguiu recuperar a evolução dos custos e da inflação em saúde que tem sido historicamente maior do que a média e a de muitos outros setores de atividade econômica. Assim, apesar das ressalvas feitas anteriormente em relação à especificidade do gasto público, pode estar havendo não só uma redução da capacidade de compras em saúde do Estado, mas também uma deterioração da qualidade do gasto.
As principais conclusões dessa postagem permitem dizer que: (i) há diferentes critérios de deflacionamento dos gastos em saúde que podem ser utilizados para fins diferenciados; (ii) para uma comparação do comportamento dos gastos públicos em saúde com outros tipos de gastos públicos, seria mais adequado utilizar índices gerais de inflação e, entre estes, o deflator implícito do PIB é recomendado internacionalmente como o mais indicado; (iii) para uma análise do como os gastos em saúde afetam o orçamento das famílias, o melhor seria a utilização de índices de preços ao consumidor, mas isto não se aplica a avaliação dos gastos públicos em saúde; (iv) o uso do IPCA como deflator dos gastos públicos, ainda que não seja adequado, não traz muitas diferenças quando comparado com o comportamento do deflator implícito do PIB nos últimos anos; (v) para uma análise do poder de compra das instituições de saúde (hospitais, centros de saúde, etc.) o melhor critério de deflacionamento seria utilizar índices de variação dos preços de produção, como, no caso do setor saúde, os VCMH; (vi) caso as instituições públicas de saúde tenham suas estruturas de custos para a produção de serviços de saúde similares às instituições privadas, deveriam ser construídos VCMH específicos que possam medir a variação dos custos e avaliar o poder de compra dos orçamentos públicos de saúde.
[i] Este artigo se beneficiou das conversas e comentários recebidos de Cláudio Contador (Diretor Executivo da SILCON Estudos Econômicos), Marcos Mendes (Consultor do INSPER e assessor legislativo licenciado do Senado Federal), Adriano Londres e Luis Feitoza (Empreendedores da Arquitetos da Saúde).
[ii] As três principais fórmulas utilizadas no cálculo de índices de inflação de uma série histórica de variação de preços e quantidades são as de Laspeyres, Paasche e Fisher. O índice de Laspeyres é uma média aritmética da multiplicação dos preços e das quantidades de uma cesta de bens e serviços, ajustada periodicamente para refletir as mudanças na padrões de consumo e de produção. O índice de Laspeyres mantem as quantidades do ano base fixas ao longo da série e pode, com isso, não refletir totalmente a mudança nos padrões de consumo. Por isso, tende a superestimar a inflação, dado que as pessoas, podem trocar bens e serviços que tem alta elasticidade de substituição por outros mais baratos quando os preços dos primeiros aumentam rapidamente. Já o índice de Paashe se baseia no uso de uma cesta de bens e serviços do período mais recente e, desta forma, acaba subestimando mudanças nos preços de itens que foram substituídos no passado por terem tido seus preços elevados. O índice de Fisher é uma média geométrica dos índices de Laspeyres e de Paasche, e, desta forma, leva em consideração tanto as mudanças dos preços no ano base como as realizadas no período mais recente. Ao assim fazer, ele tende a reduzir o viés de substituição. Outro conceito importante na análise de índices de preços é o de "encadeamento". Um índice encadeado não tem um ano base, e atualiza continuamente os pesos da cesta de bens e serviços que estão tendo seus preços avaliados, refletindo uma sequência de “fotografias” dos preços e quantidades a cada movimento da série. A vantagem do encadeamento também é reduzir o viés de substituição, deslocando os itens que compõe o conjunto de bens e serviços na medida em que os padrões de consumo vão mudando ao longo do tempo.
[iii] O IPC de São Paulo foi criado nos anos 1960, sendo transferido em 1968 para o Departamento de Economia da USP, e em 1973 para a FIPE.
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